A oferta de feijão-carioca, o tipo preferido do consumidor brasileiro, está menor em 2022, e os preços, mais altos. Com isso, o setor produtor já vê uma migração do consumo para outras variações, principalmente para o feijão preto.
A relação de preço entre os dois tipos mais consumidos já mudou. Tradicionalmente, o feijão-preto custa cerca de 85% do feijão-carioca. Agora, esta variando entre 60% e 70%, diz Marcelo Lüder, presidente do Ibrafe (Instituto Brasileiro de Feijão e Pulses).
Para ele, o brasileiro vai ter que “desapegar” da preferência –o setor produtor calcula que o carioca ocupe 60% do consumo no país. Enquanto esse tipo está custando acima de R$ 10, o preto ainda pode ser achado no varejo por R$ 6 ou R$ 7 no pacote de 1 quilo.
O momento de preços elevados pega o consumidor já apertado pela alta generalizada de preços -a inflação acumulada até abril, de 12,13%, é a maior desde outubro de 2003.
A prévia da inflação oficial de maio, o IPCA-15 calculado pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), mostra que o feijão-carioca já subiu 14,58% apenas de janeiro a maio deste ano. Em 12 meses, a leguminosa acumula alta de 21,5%.
Para Lüder, não vai chegar a faltar feijão-carioca para o consumidor, mas o produto estará mais caro, o que obrigatoriamente aumentará o consumo de outros tipos. O consumidor que não abre mão do tipo carioca deve perceber um alívio nos preços em agosto e setembro. A janela de abastecimento virá do escoamento da terceira e última safra do ano.
A folga, porém, não deve durar muito. A terceira safra do ciclo 2021/2022 chega com a menor área plantada dos últimos dez anos e respondendo principalmente pelo grão cultivado sob irrigação. Nesse modelo mais controlado de plantio, a produtividade cresce e qualidade do grão também, mas os custos subiram, puxado principalmente pelo custo da energia elétrica.
Passada a janela da terceira safra, os preços devem seguir rumo a novos picos a partir de outubro.
O descompasso entre oferta e demanda fez os preços no atacado baterem recordes em plena safra -a associação dos produtores calcula que cerca de 80% da segunda leva esteja colhida. Na semana passada, a saca de 60 quilos feijão-carioca bateu R$ 490 em Mato Grosso. No mesmo período, o feijão-preto custava R$ 225 no Paraná, principal estado produtor. Há um ano, o primeiro chegava a ser vendido por menos de R$ 300.
A redução da oferta de feijão-carioca vem da combinação de perdas -geadas intensas na região sul e estiagem em Goiás e Minas Gerais- com uma área plantada menor. Esse corte no volume de produção vem tanto da substituição por outros grãos com mercado garantido, como milho e soja, quanto da particularidade do mercado do feijão-carioca: ele só é consumido no Brasil.
Para quem produz, calibrar a produção à demanda é sempre um fator de risco. Se a área plantada cresce demais e o mercado interno não absorve, não há para quem vender. Agora, momento que haveria espaço para escoar mais produto internamente, também não há de quem comprar.
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Com outros tipos, como o preto, o fradinho e o vermelho, diz Lüder, o produtor tem mais segurança de ter mercado consumidor fora do país, se houver descasamento dos dois polos -o quanto se produz e o quanto se consome. O feijão-preto, por exemplo, mesmo que haja redução na produção, pode ser importado da Argentina. Entre janeiro e abril de 2022, 20 mil toneladas do grão foram compradas do país vizinho. No ano passado, no mesmo período, foram 6.000 toneladas. De janeiro a dezembro de 2021, as importações de feijão-preto somaram 60 mil toneladas.
Para o dirigente do Ibrafe, o momento indica vantagens ao plantio do feijão-carioca para a primeira safra de 2023, que começa a ser colhida a partir do fim de dezembro. “Essa situação abre uma opção importante para o produtor, que é a possibilidade de plantio com boa remuneração na primiera safra do ano que vem”, diz.
Lüder diz considerar que o momento mundial traz questões importantes de se discutir no mercado de feijões e pulse (como são chamados lentilha, grão-de-bico e ervilha), devido a utilização dessas leguminosas como substitutas das proteínas animais. A troca tem sido feita, segundo ele, tanto pela alta de preço das carnes, quanto pelo aumento no número de adeptos do vegetarianismo. “O feijão vem sendo a base do ‘plant based’ porque ele também demanda menos recursos naturais para ser produzido. São muitas as situações que apontam a possibilidade de a gente produzir mais.”