Ele é um dos poderes mais representativos no país mas, mesmo sendo composto por quem foi escolhido pela comunidade, torna pouco popular as despesas de sua gestão. Além de um salário que pode soar como afronta a um país pobre como o Brasil, os vereadores têm ainda alguns outros benefícios.
Um dos oficiais, e bem remunerados, são as diárias. Conforme a cidade, o valor pode sofrer variações. Destinos, formas de deslocamento e períodos de afastamento da Câmara, também interferem nas cifras. As câmaras de vereadores tem poder para definir sozinhas, e sem qualquer reclamação contrária, seus próprios valores. Uma legislação municipal, aprovada pelo Legislativo, garante a aplicação dos valores. Nem mesmo o Tribunal de Contas da União (TCU), pode interferir na autonomia da Câmara. No entanto, ela mesma precisa obedecer suas próprias regras. Estas sim, não podem ser burladas. “Para que o vereador tenha a diária, é preciso primeiro um requerimento, aval do presidente e a comprovação do gasto”, lembra o Promotor de Justiça com atribuições na área de Patrimônio Público em União da Vitória, André Bortolini.
A exceção é para os casos que destoam, com gravidade, dos demais municípios. Encontrar casos que causam surpresas, não é tão difícil e engana-se quem acredita que os abusos acontecem apenas nos grandes centros.
General Carneiro tem diária mais alta na região
De modo geral, as diárias cobrem as despesas com hospedagem e alimentação do vereador. As viagens, contudo, precisam ter sua necessidade comprovada. Além das notas fiscais das despesas, o vereador deve apresentar certificado de participação em cursos voltados para sua área ou, por exemplo, justificar visitas para deputados, presidentes de entidades ou qualquer outro compromisso do gênero.
Em General Carneiro não é bem visto o valor pago para as despesas com viagens à Brasília. A Câmara paga R$ 1.019,10 por dia para quem chega à capital. O município é mais modesto com viagens mais curtas: a diária mínima começa em R$ 254,77. No caso de Brasília, o valor se destaca na região.
O presidente do Legislativo, Dheyson Renan de Almeida, foi procurado várias vezes pela reportagem de O Comércio, durante várias semanas, mas nenhuma das tentativas feitas, tanto na Câmara quanto no estabelecimento comercial que ele administra, tiveram sucesso.
No ano passado, conforme informações do Portal da Transparência, disponível no site da Câmara de Vereadores, o Legislativo teve R$ 2.300.018,36 em despesas totais. Deste montante, as diárias pagas aos vereadores somam mais de R$ 110 mil.
O presidente Gilmar Jarentchuk (PT), de acordo com o portal, gastou R$ 16.200,00 em diárias e ocupou no ano passado o primeiro lugar no ranking das despesas. Em segundo lugar aparece o vereador Luilson Schwartz (PTB), com despesas de R$ 15.600,00 e em terceiro, Zillioto Daldin (PSD), cujas diárias somaram R$ 14.900,00. Os vereadores Mário Lúcio Pereira Ferreira (SDD) e Altamir Moreira de Castilho (PDT), ficaram na casa dos R$ 10 mil em despesas com diárias.
Jarentchuk, Schwartz e Daldin manifestaram-se sobre os gastos. Eles atribuem às despesas aos cursos de capacitação, bem como às visitas que garantiram a vinda de recursos para a região. Nenhum deles considera alto o valor gasto. Antes, encaram as cifras como investimento. “O vereador tem que fazer curso. A gente quando entra na Câmara, entra cru. As dificuldades que o vereador tem são muito grandes. As diárias de outras regiões são maiores em valor e em quantidade. Vereador tem que correr atrás, se aprimorar, para poder defender melhor a população”, afirma Daldin. Ao checar os gastos do ano passado, acredita em números razoáveis e bem aquém dos já praticados. “Se verificar no passado, muitos gastaram muito mais do que se gasta hoje”, dispara.
Schwartz também aponta as participações em cursos como motivos da despesa. O vereador enviou à reportagem um resumo de suas despesas. Conforme o texto, em 2013, ele fez 18 viagens com diárias pagas pela Câmara de Vereadores. Em algumas, ele representou o Poder Legislativo. “Como em duas oportunidades em Brasília, acompanhando o prefeito, seminários, fóruns e encontros para discussão de assuntos de interesse do município”, explica. Entre os projetos discutidos em trânsito, Schwartz menciona o Cidade Digital, que prevê internet gratuita à comunidade, e o Mobilidade Urbana, apresentado mais recentemente em plenário. “Temos vários assuntos que foram discutidos nestas viagens e que será desenvolvido neste ano”, completa.
O presidente da Câmara defende a mesma postura e acredita que o dinheiro gasto é bem menor do que os resultados conquistados para a cidade. “Como presidente eu acompanhei várias vezes o prefeito em Brasília e os custos lá são altíssimos. Mas, se for ver o que a gente conseguiu com esses R$ 16 mil que eu gastei, foram mais de R$ 120 milhões para o município. A gente tem deputados lá e se a gente não for buscar esse dinheiro, ele não vem”, explica.
No outro lado da lista, o vereador Daniel Fernando Rocha (PMDB) aparece na “lanterninha”. Ao longo de todo o ano, ele gastou R$ 1.600,00, para um curso de capacitação de quatro dias, e abriu uma distância enorme entre o primeiro colocado. “Fiz o curso, mas isso não melhorou o meu currículo”, comenta Rocha, atribuindo à sua formação – em Direito e pós-graduado na área de Finanças – seu posicionamento. Outras três viagens feitas no ano por ele não custaram nada à Câmara. “Fui à Curitiba para visitas ao deputado Alexandre Curi e usei dinheiro particular para isso”, explica. Para Rocha, o uso das diárias pode ser mais econômico. Ele julga necessário o bom senso dos vereadores e para os cursos, maiores justificativas para as viagens, tem sugestões. “Temos duas faculdades de direito na cidade. Poderíamos fazer treinamentos aqui mesmo, sem precisar gastar dinheiro do povo”, diz.
O vereador Sandro Calikoski (PMDB) lidera isoladamente o ranking dos que mais gastaram em 2013 com diárias. De acordo com o Portal da Transparência, também disponibilizado no site da Câmara de Vereadores, no ano passado suas despesas em diárias somaram R$ 28.050,00, o que abriu uma distância razoável para o segundo colocado, o vereador Alceu Jung (DEM), que gastou R$ 9.910,00. Os vereadores Paulo Kovalski, Maria Aldair de Carvalho, Carlos Roderlei Pinto e Christian Martins, empatam em diárias que giram em torno dos R$ 7 mil.
Calikoski, que no ano passado era presidente do Legislativo, acredita que seus gastos foram razoáveis, já que o retorno, em cifras e projetos, para o município, foi significativo. O então presidente acredita que seu poder de articulação, definido assim por ele mesmo, o colocou na estrada inúmeras vezes. “Eu consegui mais de R$ 1,5 milhão entre os governos Estadual e Federal, com os parlamentares”, diz. Parte deste recurso, segundo ele, foi aplicado nas ruas Padre Landel de Moura, no Bairro Jardim Brasília, na criação de academia ao ar livre e na construção do Posto de Saúde do Bairro São Pedro.
Além de Brasília, Calikoski menciona viagens para Curitiba e São Paulo. Há ainda os deslocamentos à Florianópolis, necessários, segundo ele, diante de uma ineficaz Secretaria do Desenvolvimento Regional (SDR), cuja finalidade, em tese, deveria aproximar o governo estadual dos municípios mais distantes. “A SDR não serve para nada para nós. Muito pouca verba vem através dela. Ela não funciona na nossa região”, dispara. Segundo ele, já há projetos para manter em funcionamento apenas as unidades maiores. “Não funciona a de Canoinhas nem a de Mafra”, diz. Pontuando seus gastos, o vereador acredita que não gastou muito. “Minhas despesas foram razoáveis pelo resultado conquistado”, reforça.
O que é imoral, tem punição
Conforme o Promotor Bortolini, mesmo não sendo ilegal, o abuso das diárias infringe o princípio da moralidade, defendido pela Constituição Federal. Por conta disso, o Tribunal de Justiça pode agir na defesa da moralidade. “Ele pode controlar a constitucionalidade e exigir explicações quanto ao abuso da moralidade”, lembra o Promotor. Vale questionar ainda, a necessidade de tantos cursos e capacitações, bem como o endereço em que elas são realizadas. Em geral, elas ocorrem em cidades turísticas, de divisas e de fortes tendências comerciais.
Dionísio Cerqueira, endereço popular para cursos
A cidade fica no limite entre o Paraná e a Argentina. O município é um dos principais destinos para cursos e capacitações dos vereadores de União da Vitória. Chama a atenção, contudo, a falta de aspectos potenciais para que a cidade torne-se tão procurada para eventos organizados para o Poder Legislativo. Com menos de 15 mil habitantes, Dionísio Cerqueira tem apenas no aspecto turístico seu cartão-postal. Um dos atrativos é o marco das Três Fronteiras, onde é possível colocar um pé no Paraná, outro em Santa Catarina e, ainda, com o braço, alcançar o território argentino.
Diárias gastas pelos vereadores de UVA em 2013
Carlos Romeu Bueno
R$ 4.200,00
Clarito de Nivardo Barbosa
R$ 5.800,00
Daniel Fernando Rocha
R$ 1.600,00
Waldir Luis Cortelini
R$ 2.150,00
Mário Lúcio Pereira Ferreira
R$ 11.400,00
Júlio Adilson Pires
R$ 4.700,00
Ricardo Adriano Sass
R$ 7.800,00
Luilson Schwartz
R$ 15.600,00
Altair Lourenço de Souza
R$ 6.100,00
Zillioto Daldin
R$ 14.900,00
Gilmar Jarentchuk
R$ 16.200,00
Altamir Moreira de Castilho
R$ 10.400,00
Carlos Humberto Topolski
R$ 2.700,00
Valdecir José Ratko
R$ 6.900,00
Diárias gastas pelos vereadores de PU em 2013
Alceu Jung
R$ 9.910,00
Almir Olímpio Borini
R$ 4.500,00
Carlos Roderlei Pinto
R$ 7.200,00
Christian Martins
R$ 7.875,00
Gildo Masselai
R$ 4.125,00
Maria Aldair de Carvalho
R$ 7.200,00
Osmar Alves Martins
R$ 6.300,00
Paulo Kovalski
R$ 7.875,00
Sandro Luciano Calikoski
R$ 28.050,00
O preço das viagens na região
União da Vitória (PR)
Valor é R$ 400, para viagens dentro do estado e Brasília.
Porto União (SC)
Diária é R$ 450 para vereadores e R$ 400 para servidores. Valor vale para viagens até a capital do país.
Bituruna (PR)
R$ 300 para viagens dentro do estado e Brasília
General Carneiro (PR)
Valores variam de R$ 254,77 à R$ 1.019,10 (para Brasília)
Paula Freitas (PR)
Valores variam. Para viagens na microrregião, diária é R$ 80 e para fora do estado, R$ 300. Diárias para viagens internacionais são de R$ 450. Há ainda reembolso no caso do uso de transporte público.
Paulo Frontin (PR)
Diária é R$ 350 para viagens de até 300 quilômetros. Para Brasília, Câmara paga R$ 500.
Porto Vitória (PR)
Diária é R$ 250. A chamada diária “especial”, concedida para outros estados e Distrito Federal, é R$ 450. A Câmara paga também inscrições para cursos e capacitações.
São Mateus do Sul (PR)
Não tem valor especificado. A diária é paga a partir dos comprovantes, com reembolso.
Cruz Machado (PR)
Valor é R$ 250, com pernoite e R$ 150, sem pernoite.
Canoinhas (SC)
Dentro do estado, diária é R$ 228. Para Florianópolis, R$ 274,46. Quem usa transporte particular recebe R$ 0,60 por quilômetro em combustível.
Matos Costa (SC)
Até 100 quilômetros dentro do estado, diária é de R$ 177. Acima de 200 quilômetros, valor sobe para R$ 354 e R$ 389,40. Para Brasília, diária é de R$ 531.
Irineópolis (SC)
Diária está fixada em R$ 350, para vereadores, e R$ 420 para o presidente do Legislativo. A variação só ocorre para viagens fora do estado. O valor aumenta para 50%, no caso do presidente, e 40%, para os demais vereadores.