Carlos Ohara, Folha de S. Paulo
Inquérito policial militar concluiu que o ex-governador e senador Roberto Requião –candidato do PMDB ao Executivo estadual nestas eleições– utilizou recursos físicos e humanos da PM do Paraná para cuidar de cavalos de sua propriedade quando comandou o Estado (2003-2010).
O documento sigiloso, ao qual a Folha teve acesso, diz que medicação e alimentação dos animais particulares foram custeadas com verbas do governo e o manejo e trato dos animais foram realizados por policiais militares, em caso já relatado anteriormente pela reportagem.
De acordo com o IPM (Inquérito Policial Militar), Requião chegou a constituir um destacamento policial na Granja Canguiri –residência oficial onde ele morava– exclusivamente para cuidar dos cavalos. Em junho de 2008, seis policiais cumpriam plantão no local com escalas de 24 horas de trabalho e 48 horas de folga.
A unidade policial foi desativada dois anos depois após a saída do ex-governador do cargo. Em depoimento, um oficial disse que, além de cavalos, o ex-governador mantinha no local “porcos, cachorros, pavões, veados e antas”.
Cópias do IPM, aberto em maio e concluído no inicio de setembro, foram encaminhadas à Justiça Militar e à Promotoria de Proteção Patrimônio Público, onde a promotora Cláudia Cristina Martins Madalozo apura suposto crime de improbidade administrativa.
“Há indícios de que bens, recursos e serviços do Regimento de Polícia Montada foram utilizados em prol de animais pertencentes a particulares”, diz outro trecho do IPM, assinado pelo comandante geral da PM paranaense, César Vinicius Kogut.
Conduzido sob sigilo, o inquérito registra depoimentos de dezenas de militares que atuam ou atuaram no Regimento de Polícia Montada. O IPM isenta os policiais de qualquer culpa, afirmando que eles não “auferiram qualquer benefício com a condição irregular dos cavalos”.
Na condição de testemunhas, militares disseram que acreditavam que os animais seriam doados à PM. Documentos registram que o ex-governador oficialmente doou nove cavalos à corporação em 2005 e, em 2007, intermediou a doação de 21 outros animais, através da Enterprise Empreendimentos Imobiliária S/A, pertencente a Francisco Simeão, primeiro-suplente de Requião no Senado.
Parte dos animais eram cedidos por Requião para uso da PM –para patrulhamento e apresentações em desfiles e competições– e outros eram de seu uso exclusivo, relata o IPM.
Em fevereiro de 2010, quando deixou o governo para concorrer ao Senado, Requião determinou ao comandado do Regimento de Polícia Montada que todos animais de sua propriedade fossem reunidos.
O IPM revela que não ocorreu a doação. Animais listados como sendo do ex-governador deixaram de aparecer na relação dos animais estabulados no haras da PM, dias após a seleção.
“Além disso, equinos que antes constavam nas escalas de serviço pararam de ser empregados após a mencionada seleção”, informa o inquérito militar.
DOCUMENTOS NÃO ENCONTRADOS
O IPM não conseguiu identificar o número exato de cavalos do ex-governador nem os valores gastos com os animais. A justificativa é que decorreram quatro anos desde a saída do ex-governador. “Boa parte da documentação que poderia elucidar pontos controversos não foi localizada.”
Em agosto, um oficial que ocupou posto de comando no Regimento de Polícia Montada disse à Folha, sob condição de anonimato, que 88 animais de Requião, de raças como mangalarga, foram abrigados nos haras da PM.
Considerando o custo mensal de manutenção de cada cavalo (R$ 1.000 a R$ 1.500), de acordo com cálculo da assessoria de imprensa da PM, o gasto com os animais do senador pode ter superado o valor de R$ 8 milhões, durante os oito anos de seu mandato no Paraná.
OUTRO LADO
Informada sobre o resultado do IPM concluído, a assessoria de imprensa de Roberto Requião enviou nota dizendo que o senador já se pronunciou publicamente e classifica o episódio como “denúncias infundadas e fantasiosas de cunho eleitoreiro”.
Em agosto, em entrevista à Folha, Requião negou que tenha usado estrutura pública para manter cavalos de sua propriedade. “Isso é uma bobagem, não existe, é uma palhaçada total”, afirmou.
Ele desqualificou os responsáveis pela denúncia, dizendo que ela foi feita pelo ex-deputado estadual pelo PMDB José Domingos Scarpellini, hoje afastado politicamente de Requião.
“Cavalo come capim. Quem comia o que não devia eram os deputados que aderiram ao [atual governador] Beto Richa (PSDB)”, comentou o senador.
Ao jornal “Gazeta do Povo”, o advogado Luiz Fernando Delazari, assessor jurídico de Requião, disse em julho que o total de cavalos do senador sob cuidados da PM era inferior a 88, mas não precisou o número. Ele também negou irregularidade porque os animais eram empregados em atividades da PM.