Pandemia leva franceses a promover galinhas a animais de estimação

Além de botarem ovos, as galinhas reciclam cerca de 150 quilos de comida por ano. As famílias compram os bichos para forjar um 'ar de campo' em suas casas

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Atualizado há 4 anos

No país que tem o galo como um dos símbolos nacionais, elas sempre tiveram seu lugar nos lares daqueles que dispõem de um pátio ou jardim – e a pandemia de coronavírus aumentou ainda mais o afeto dos franceses pelas galinhas.

Os dados oficiais são incompletos, mas os vendedores de animais domésticos atestam que a procura pelas aves registra um sucesso inédito desde que a população passou a conviver com as restrições impostas pela Covid-19.

Moradora de Neuilly Plaisance, na região parisiense, a consultora de seguros Stephanie nem pensou em adotar um gato ou um cachorro. Nos momentos de reclusão forçada, a família buscou forjar um “ar do campo” para se reconfortar em casa. As três galinhas foram a companhia perfeita para distrair a filha, Louise, durante os períodos de lockdown na França, principalmente quando as escolas fecharam.

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Galo doméstico francês — Foto: Xavier Leoty/ AFP

“Era o meu sonho. Eu sempre pensei que o dia que eu tivesse uma casa com jardim, eu teria galinhas. Elas me lembram a minha avó”, comenta. “A minha filha adora, brinca com elas, dá comida. Elas são uma companhia porque, com o lockdown, ela via poucas crianças e, como é filha única, se divertia com as galinhas no jardim”, disse.

Para quem acha que as galinhas não gostam de um carinho, como qualquer outro animal de estimação, Stephanie conta que se surpreendeu com a comunicação das aves. “Elas compreendem algumas palavras. Não é como um cachorro, mas elas conseguem nos reconhecer, por exemplo”, afirma. “Quando a gente coloca a mão em cima delas, elas se agacham para serem acariciadas”, diz a francesa.

 Ela relata que pagou apenas € 5 (R$ 33) por cada galinha, mas já teve de recorrer a um veterinário quando uma delas sofreu uma inflamação. A conta foi salgada: € 135 (R$ 890). “Fiquei surpresa com o valor, mas quando a gente tem um animal de estimação, tem que cuidar.”

Reciclagem de alimentos

Já para a vendedora Marie Boschat, o que mais contou na escolha foram as motivações ambientais. Preocupada com uma alimentação mais saudável e sustentável, a ideia de adotar galinhas uniu o útil ao agradável. Além de poder contar com os ovos diários das três galinhas, compradas entre dezembro e janeiro, ela também está satisfeita em poder dar um novo destino para os restos de comida da casa – já que as novas moradoras comem de tudo.

“Eu sempre achei legal ter nossos próprios ovos e poder dar os nossos restos para elas. Assim, sabemos de onde vem os ovos que consumimos e, como não tenho uma compostagem, o nosso lixo orgânico tem um destino decente”, comemora. “Sem contar que é divertido ter elas por perto. Vou ali no jardim e fico com elas. É bacana.”

 O empreendedor Thomas Dano observou um boom na procura por galinhas pelos moradores de áreas urbanas, nos últimos meses. Há quase quatro anos, ele abriu o Poules pour Tous (Galinhas para Todos), um site que coloca em contato avicultores e compradores como Stephanie e Marie.

Thomas acha que, para muitos franceses, a pandemia levou ao amadurecimento de reflexões ambientais como desperdício alimentar, reciclagem de lixo e uma alimentação mais respeitosa do meio ambiente.

“As galinhas reciclam cerca de 150 quilos de comida por ano, ou seja, temos menos lixo. E menos lixo faz bem para o planeta também”, frisa o fundador do site. “No fim, todo mundo fica contente: os produtores ficam felizes porque dão uma segunda vida para as galinhas; nós, porque conseguimos viabilizar isso; os clientes, porque fizeram um bom negócio e terão ovos frescos no jardim; a galinha, claro, fica contente por poder continuar a viver, e é bom para prefeitura ter menos lixo para recolher e tratar.”

Foram esses tipos de argumentos que convenceram Marie Bochat a adotar as galinhas, ainda mais depois de receber um galinheiro de aniversário dos avós. “É verdade que eu vi muitas reportagens na televisão, mostrando como era legal, e isso pode ter me influenciado. É meio bobo dizer assim, mas hoje está um pouco na moda ter as próprias galinhas, produzir os ovos em casa”, comenta.


Em vez do frigorífico, um jardim

Os lares dos franceses se transformaram num verdadeiro salvo-conduto para milhares de aves destinadas aos abatedouros. Depois do primeiro ano de vida, os ovos das chocadeiras ficam mais frágeis. Menos rentáveis, elas acabam encaminhadas aos frigoríficos.

Além disso, em conformidade com as normas sanitárias, uma vez por ano os galinheiros devem passar por uma limpeza completa – e a solução mais simples para fazê-la acaba sendo se desfazer definitivamente dos animais.

“Os produtores precisam retirar todas as galinhas para limpar e não têm como pedir para um vizinho cuidar das 10 mil galinhas durante o tempo da limpeza sanitária, que leva cerca de oito semanas. Ou seja, é impossível”, explica o empreendedor. “Os produtores só tinham uma saída: o abatedouro.”

 Thomas conta ter salvado 60 mil galinhas nos três primeiros anos do Poule pour Tous – e, desde setembro, mais 30 mil encontraram um novo lar.