Imagine ficar sem trabalho e de porta em porta receber um sonoro ‘não’ como resposta. Essa é a rotina diária de pelos menos 200 desempregados em União da Vitória e outros cem, em Porto União. Os números, divulgados pela Agência do Trabalhador e pelo posto do Sine, revelam a dificuldade de um ano complicado, com pouco giro de dinheiro e contas altíssimas para pagar. Nos balcões de emprego, sobram esperanças mas faltam oportunidades. A estagnação econômica que aflige o País, desembarcou nas Cidades Irmãs. E, ao que parece, a visita não tem data para acabar.
Cenário
Em União da Vitória, a Agência do Trabalhador é um dos termômetros mais pontuais. Por lá, de acordo com o responsável pelo órgão, Osni Nunes, cerca de 200 pessoas buscam uma oportunidade de trabalho. A maioria sai de lá sem qualquer resposta positiva. “Essa situação está assim desde outubro, quando as ofertas enfraqueceram muito. Nem o pessoal de fora, que contratava gente daqui, veio mais”, revela.
A referência é para, por exemplo, a Perdigão, uma das grandes recrutadoras de mão-de-obra local. As visitas quase mensais, então feitas em 2014, ainda não aconteceram neste ano. “E todo mês ela levava de dez à 12 trabalhadores”, lembra Nunes. As empresas que terceirizam a colheita de uva e maçã, também não colocaram os pés em União da Vitória em 2015. “A crise chegou”, desabafa. “A recessão chegou e o povo está pagando o pato”, completa. Na agência, o número de vagas é baixo e quando tem, são disputadas quase “à tapas” pelos candidatos. A conquista de um lugar ao sol tem valido bem mais que um concorrido vestibular. “Nunca vi isso em 60 anos de vida. E olha que já vivi no regime militar”, avalia. Apenas no entorno da agência, três empresas fecharam suas portas neste ano.
Cenário idêntico amarga o balcão de empregos do posto do Sine em Porto União. “De janeiro para cá, temos uma, duas vagas. É pouco mesmo”, revela o responsável da unidade, Valter Alves da Silva. Por dia, o balcão recebe até cem desempregados, dispostos, inclusive, a guardar seu currículo e às vezes o canudo de graduação, para ter a carteira assinada. “Mas nem vaga para serviços gerais ou domésticas nós temos mais”, lembra Silva.
Quando a vaga surge, a disputa nasce: em média, a relação é de 25 candidatos para uma vaga. “Além do nosso pessoal, tem os estudantes que vem de fora e também querem trabalhar enquanto estudam”, aponta. As ocupações mais atraentes, como auxiliar de escritório ou administrativo, por exemplo, estão em extinção. “Sumiram. Não tem mais nada”, lamenta.
Teoria e prática
O que ocorre nas Cidades Irmãs parece um contrassenso. União da Vitória e Porto União são reconhecidas como polo universitário e, somado às quatro instituições de ensino superior, exibem na vitrine cursos profissionalizantes, oferecidos em grupos grandes, como o sistema Senac e Sesi. Ainda, mais recentemente, União propaga seu Instituto Federal, a menina dos olhos da atual Administração mas também seu próprio “tendão de Aquiles”. Afinal, para onde vai tanta gente capacitada? As cidades ofertam instrução, mas não conseguem absorver seus próprios novos profissionais. “Na verdade o momento é de parcimônia. A crise é um momento psicológico, cujos atores (empresários, investidores, população) ficam receosos de gastar em produtos que não lhe garantam somente a sobrevivência, ou seja, não se gasta em produtos supérfluos”, pontua o economista Álvaro Concha.
Para ele, outro aspecto importante é que muitos saem da universidade ou dos cursos técnicos com a ideia de que estão prontos para o mercado de trabalho. “O que não é uma verdade. E o mercado já está saturado de profissionais que façam a mesma coisa, que atuem no mesmo ramo de atividade: isso também é uma forma de criar desemprego. A crise que estamos passando é passageira e que em breve haverão vagas, porém esses profissionais devem se gabaritar cada dia mais e em áreas que sejam especificas, não em áreas generalistas”, diz.
Comércio “segura as pontas”
Menos malévolo que outros setores, o comércio ainda consegue manter a estabilidade no número de empregados. Quando não, trabalha no “vermelho” mesmo, com menos funcionários. Mas, demissões, não são frequentes. Para o Sindicato do Comércio de União da Vitória, a rotatividade do setor é uma das garantias de estabilidade. “Sai um, entra outro”, comenta o presidente da entidade, Maurício Testi. Conforme ele, apenas em janeiro uma pequena crise pairou sobre o setor. Mesmo assim, não houve demissões.
O presidente da Câmara dos Dirigentes Lojistas (CDL) entende que o setor não está, digamos, em seu auge. Tampouco, porém, perto do que ocorre com as madeireiras, por exemplo, que demitem muito mais a partir de crises. “As vagas estão sendo mantidas, mesmo nos períodos mais complicados. O que temos percebido é que se um funcionário sai, a loja trabalha com a redução quando não consegue contratar mais”, avalia Luciano Karpovisch. Para ele, a estabilidade consegue se manter assim mesmo em dias difíceis, inclusive, de pouca venda. “Somos mais bonzinhos. O madeireiro parece que não perdoa muito”, avalia.
E como vai o setor madeireiro?
A reportagem de O Comércio entrou em contato com o Sindicato Patronal da Madeira de União da Vitória mas, até o encerramento desta reportagem não houve resposta aos questionamentos feitos. O que sabe, porém, de maneira extraoficial, é que as demissões estão ocorrendo, e não são poucas.
Conforme IBGE, taxa de desocupação em abril foi de 6,4%
De acordo com o instituto, nas seis regiões metropolitanas investigadas, o contingente de desocupados foi estimado em 1,6 milhão de pessoas. O índice é alto e em relação à abril do ano passado, o número aumentou. A população ocupada, por outro lado, foi estimada em 22,8 milhões para o conjunto das seis regiões, refletindo estabilidade nas análises mensal e anual. Os dados do IBGE foram divulgados nesta semana.