Por Mariana Honesko
Mesmo frequentando a associação da Terceira Idade, ele não tem o perfil de quem já passou dos 70 anos. Aposentado há sete, mantém uma rotina de fidelidade com uma clientela tão fiel quanto. “Estou na terceira geração”, sorri Egon Langer, barbeiro desde os 17 anos. Entre um corte e outro, Langer sorri, mantém-se alinhado dentro de um modelo social e esboça passividade. Para seus clientes, essencialmente homens, esta é uma de suas principais características. “Ele é paciente, faz o trabalho com calma”, elogia o aposentado Luiz Carlos Lichovski. “A leveza da mão dele é impressionante”, endossa o advogado Felipe Scaramella, cliente há dez anos.
Passividade, contudo, não é seu perfil fora da barbearia, uma pequena porta aberta todos os dias, no trevo do Posto Iguaçu, em Porto União. Langer aprecia passeios longos a bordo do que chama de “Fusca de duas rodas”, uma referência bem humorada para sua bicicleta. “Nunca pensei em ter um carro. Pude comprar, mas nunca quis”, conta. O gosto pelo esporte supera limites. Morador há 40 anos da rua Theodoro Kroetz, o barbeiro precisa de fôlego – e isso parece ter de sobra – para encarar todos os dias o trecho. A via é o acesso principal para o Morro da Cruz, cartão-postal da cidade.
A vida simples, iniciada no distrito de Santa Cruz do Timbó, garantiu o sustento de sua família e a manutenção dos estudos dos três filhos. Nenhum seguiu a profissão do pai, mas todos estão bem encaminhados. Dois deles são professores e um mecânico.
O barbeiro, dono da Barbearia Príncipe, trabalha sem agenda mas quem chega sem avisar, precisa esperar. O movimento não é tão grande quanto no início de sua carreira porém, ainda faz lotar sua pequena e distinta sala. Em média, até 15 clientes são atendidos todos os dias. Nas quartas e sextas, a barbearia fecha. “É quando eu atendo dois clientes cadeirantes. Quando eles podiam vir, vinham. Agora eu vou até eles também”, sorri. “Eu gosto do trabalho. Converso com um, com outro, o dia passa rápido”, garante.
Os clientes de Langer conhecem bem o trabalho do barbeiro. Na cadeira centenária, de ferro, quem se senta não abusa dos pedidos. “Não faço cortes modernos. Corto o que aprendi. É clássico mesmo”, explica. Os cabelos, por exemplo, não são molhados antes do corte. É a seco, sem qualquer borrifada de spray, creme ou qualquer outro produto. Para aparar a barba, Langer afia a navalha, protege o rosto do cliente com creme e como quem esculpe uma peça, retira os pêlos, sem deixar caminhos ou falhas. “Olha como ficou bom. Não tem nada de falha”, sorri, orgulhoso com o trabalho do colega ainda de infância, o aposentado Pedro Balduíno Eckl.
A classe não está apenas no trabalho. A barbearia é cravada de detalhes tradicionais. Não bastasse a impressionante e resistente cadeira, o brasão do Palmeiras, time do coração do barbeiro, a sala é decorada com moveis de imbuia, capazes de resistir mais um século de vida. Na parede, há obras de arte e fotografias históricas. Algumas registram as primeiras décadas de Curitiba. Outras “narram” em silencio o nascimento das Cidades Irmãs. “Estas fotos da cidade estavam na biblioteca da Federal (UFPR). Meu filho trabalhava lá, fez cópia e me mandou”, conta.
Em casa, o jeito pacato continua. Além de pedalar, Langer cuida dos vasos de flores cultivados pela esposa, bem como do jardim de sua casa. “E continuo assim. Fico em casa e trabalho. Dá para o feijão, arroz, o osso”, brinca.
Natural de Jaraguá do Sul (SC), Langer mudou-se para o interior de Porto União quando era menino, aos seis anos. Lá, começou a trabalhar como servente de pedreiro. Em pouco tempo, porém, foi ajudar o barbeiro, Pedro Luiz Andrade. Começou de mansinho, auxiliando em funções diferentes, e logo aprendeu o oficio. Aos 17 anos, já era hábil com as lâminas. “Foi com ele que aprendi a profissão”, conta. Em 1953, quando se mudou para a área urbana, dividiu uma barbearia com outro colega. As parcerias com profissionais duraram algum tempo mas, há 49 anos, Langer trabalha sozinho. “Quando casei, comecei a trabalhar assim”, explica.