A ideia é ousada, já tem quase três anos e só se tornou possível pela parceria de “mentes pensantes” e instituições de apoio. Embora sem estar concluído – mas com 60% já pronto – o resultado é um sinal claro de que valeu a pena.
Ontem, em uma coletiva de imprensa, os idealizadores e construtores do modelo Morane Saulnier Parasol L, usado pelo Capitão Kirk na Guerra do Contestado, há um século, apresentaram o andamento e os motivos do projeto. O encontro aconteceu no 5º Batalhão de Engenharia de Combate Blindado, de Porto União.
Longe, de fato, da marcenaria do Centro Universitário da Cidade de União da Vitória (Uniuv), onde o trabalho de construção ocorre. Por lá, trabalham apenas voluntários – o investimento também é assim – que, se comunicam pelas redes sociais. De maneira pública, por outro lado, é possível acompanhar a execução das peças e a evolução do modelo a partir da página “Amigos do Capitão Kirk” no Facebook.
O projeto segue em andamento e não é de uma única instituição, mas, da comunidade das Cidades Irmãs. Conforme os criadores, a réplica deve ficar pronta em julho. Em agosto, iniciativa da Universidade do Contestado (UnC) garante sua exposição no Ginásio Lauro Müller Soares. A visitação será aberta ao público.
Em setembro, quando Porto União comemora seu aniversário, o Parasol vai para a Praça do Contestado, de onde não deve sair tão cedo. Nem voar: embora tenha motor, o avião não decola. A peça é apenas ilustrativa, praticamente fiel a original, e fica sob a hélice, outra “cópia” perfeita do modelo original.
Entenda melhor o projeto
Tudo começou em 2012 (na UnC) quando, após uma aula de História do Contestado, os professores Aluízio Witiuk e Marcelo José Boldori começaram a pensar sobre a possibilidade de construção do mesmo avião pilotado por Kirk. Inicialmente, o projeto previa a construção do avião em escala reduzida, para que pudesse ser levado no desfile de 7 de setembro em um caminhão, por exemplo. Então, começaram os estudos, com foco no modelo, plantas – originais da Inglaterra – e materiais para a construção. “Essa é mais uma etapa. Já foram várias, teremos mais algumas mas é agora que o avião tomou formatação”, comemorou Boldori.
Logo, porém, Witiuk voa mais alto. Para Boldori, sugeriu a construção de uma réplica em tamanho real, para ser colocada na futura Praça do Contestado já em andamento (o espaço fica em frente ao 5º Batalhão), para homenagem do Patrono da Aviação do Exército Brasileiro, justamente o Capitão Ricardo João Kirk. “Se nós queremos formar cidadãos precisamos mais do que nunca resgatar a história. O povo sem isso não tem memória. A ideia é dar esse presente para a população e para quem chega nos visitar”, defendeu Witiuk.
O sonho de construção foi compartilhado com o então comandante do quartel, Coronel Edilson. Conforme material distribuído à imprensa, “a ideia foi recebida com muito entusiasmo pelo comandante que, inclusive, disponibilizou o busto do Capitão Kirk para a praça, sendo colocado junto à réplica”. O comandante foi transferido mas a proposta acolhida igualmente bem pelo novo “chefe”, Carlos Eduardo Franco Azevedo, que acabou se tornando um dos principais entusiastas do projeto.
A construção do avião foi tomando projeções maiores e logo também conquistou os prefeitos de União e Porto União.
O “Parasol”
Não foi por acaso que o modelo pousou na terrinha. Depois da apresentação da proposta na prefeitura de Porto União, o projeto foi levado para a UnC, novamente. Na instituição, o professor Jacob Augusto Krapp Hoff comentou que havia visitado o professor e engenheiro Roberto Pedro Bom e, na casa dele, havia visto uma miniatura do avião “Morane Saulnier Parasol L”.
Era o destino que descobriu, entre outras nuances surpreendentes, que Bom alimentava o sonho de construir a réplica. “O professor Jacob tratou de colocar o professor Bom em contato com o grupo da UnC, somando esforços para a realização do projeto”, explica a nota para a imprensa. “O professor Pedro Bom, pelas pesquisas que já havia feito, pelos seus conhecimentos de engenharia e o acesso às plantas originais do avião que pretendíamos construir, tornou-se o grande maestro da construção da réplica”, completa.
E foi com maestria que Bom se debruçou sobre o projeto. Conseguiu, da Inglaterra, as plantas originais do modelo. Depois, decidiu por alterá-las e, junto com os amigos, abusar da criatividade. “Peguei o projeto, passei para o autoCAD (programa para uso de plantas de engenharia), desenhei as peças, mandei cortar e algumas eu cortei. O resto foi um bocado de criatividade”, sorri. “O motor, por exemplo, foi inspirado em decisões de boteco”, completa. Segundo Bom, o avião é praticamente o mesmo, com exceção da aerodinâmica das asas. “Mas os tamanhos, tudo, é bem próximo do original”, garante o engenheiro.
Busto de Ricardo Kirk é inaugurado em Campos dos Goytacazes
A Câmara de Vereadores de Campos dos Goytacazes (RJ) inaugurou há alguns dias o busto do campista Ricardo João Kirk, primeiro aviador militar brasileiro e, também, o primeiro aviador a morrer em ação de combate nas Américas.
Para a solenidade, o doutor Edson Batista, presidente da Câmara, convidou o Comando Nacional da Aviação do Exército e o 56º Batalhão de Infantaria, que participaram com pelotões e brigadas, incluindo um helicóptero modelo Esquilo (de combate) que partiu de Taubaté (SP). O Hino Nacional foi executado pela Lira Guarany.
A inauguração do busto foi seguida pela exibição de um documentário sobre o aviador. Ele foi apresentado na TV Câmara Campos. Para a gravação especial, uma equipe entrevistou comandantes militares em São Paulo (general Achilles Furlan Neto), Porto União, coronel Eduardo Franco Azevedo, além de historiadores e professores das universidades da região do Contestado.
Um herói chamado Ricardo João Kirk
Ele nasceu em Campos, no Rio de Janeiro, em 1874. Em 1893 já estava matriculado na Escola Militar e recebeu a primeira promoção na carreira anos alguns depois. Sua estreia no ar, conforme o artigo assinado por Witiuk, foi a bordo de um Blériot, pilotado pelo francês Roland Garros, um dos pioneiros da aviação francesa.
Na França, Kirk procurou especialização. Assim, cursou a École d’Aviation d’Étampes. Com o curso, recebeu o brevê em outubro de 1912. Ao retornar para o Brasil, participou do nascimento do Aeroclube Brasileiro, onde desempenhou o cargo de Diretor Técnico. Foi, portanto, o primeiro aviador militar do Exército brasileiro.
Por “atos de bravura”, foi promovido ao posto de Capitão em 4 de março de 1915.
Fotos: Mariana Honesko