Uma gestação mexe com os hormônios, com a rotina, com as prioridades. Mas no caso de Luciana Eleonora Nunes Gracino, 39, a gravidez mexeu com o coração. Trata-se de uma jornada ao passado. Luciana, moradora de Santos (SP) mergulha em sua própria história, que tem em seu nascimento como o ponto mais indecifrável. Adotada ao nascer, Luciana decidiu conhecer sua história real. Embora sempre tivesse essa curiosidade, foi ao descobrir grávida que a vontade cresceu.
“Quando eu era pequena, minha mãe sempre falou que eu era filha do coração dela. Então nunca tive problema de lidar com isso, com o fato de ser adotada. Pra mim sempre foi natural. Minha mãe dizia sempre que mãe biológica tinha morrido, só que quando eu comecei a crescer, ela mudou a história”, contou.
Até bem pouco tempo, Luciana sabia apenas que sua mãe, solteira, tentou por cerca de uma década a adoção legal. Nenhuma teve sucesso. “Um dia ela conheceu uma pessoa que falou que ela tinha conseguido adotar uma criança no Sul. Ela decidiu ir para o Sul e contou que ficou numa cidade distante”, lembra.
A ‘cidade distante’ seria Porto União, conforme Luciana. Ela só descobriu a real localização de seu nascimento no final de 2019, depois de publicar sua história na internet e em alguns canais da imprensa. Oficialmente ela é paulista, registrada cinco dias após seu nascimento, com data de nascimento marcada no calendário em 20 de maio de 1980.
“Minha mãe foi ao encontro dessa médica, que na hora estava fazendo um parto. Ela foi falar com a minha mãe e ela disse: ‘olha, sua filha acabou de nascer; tem uma criança que a mãe deixou no hospital e ela é sua’. Minha mãe ficou atônita”, disse Luciana
Ainda conforme sua mãe adotiva, a médica teria contado que a mãe que acabara de dar à luz, era jovem, de 18 anos, que escondia a gravidez. “Ninguém sabia que ela tava grávida, que não podia ficar com a criança. Ela acabou me deixando no hospital”.
A procura
Luciana iniciou a procura pela mãe biológica no ano passado. Demorou decidir, especialmente por medo de, conforme ela, atrapalhar a vida de sua mãe biológica. “Minha mãe faleceu já. Ela tinha 55 anos quando me adotou e da minha família que participou da adoção, já não tinha como buscar. Com a divulgação no Facebook e na imprensa, isso foi começando. Ainda não conheço a cidade (Porto União) pessoalmente. Sempre tive medo disso, dessa busca, medo de atrapalhar a vida dessa pessoa, até pelo fato de ela não ter contato para ninguém na época e de repente, aparece eu”, explicou. A certeza de que sim, era preciso ir em frente, veio com sua gravidez e com toda a transformação que isso causa. “Depois que fui mãe, que carreguei minha filha, isso mexeu demais comigo. Pensei: ‘não tem como não amar uma criança que está dentro da gente’. Comecei a pensar no quanto ela (a mãe biológica) sofreu por me deixar no hospital. Nunca tive sentimento de mágoa, raiva. Sempre imagino que ela é uma pessoa boa, e eu acredito que ela tomou essa decisão porque não tinha alternativa”.
Até agora, as pistas são difusas. Nada é ainda concreto. Luciana sabe, por exemplo, que sua mãe biológica estaria hoje com 57 anos e que seria parecida com ela: alta, de cabelos claros e de descendência européia.
“Meu intuito é trazer alegria, amor, tirar essa pessoa da tristeza. Queria deixar ela leve, tranqüila e feliz”, afirmou.
De sua história, até aqui, Luciana guarda apenas memórias doces. Criada pela mãe, Ivone, sem pai ou irmãos, aprendeu a ser independente, a cuidar de si e do que é seu. No coração, alimenta saudades de uma mulher que viveu para ser mãe, uma senhora adulta e madura, que soube ser amiga e conselheira. “Eu senti muito a falta dela quando ela foi embora. Éramos muito amigas, ela me conhecia demais. Senti muito. Isso também me fez pensar na procura”.
Construindo novos capítulos em São Paulo, Luciana é esposa e mãe e antes de tudo, sonhadora. No coração, está o amor de mãe e o desejo de pertencer à uma grande família. “Meu sonho sempre foi ter uma família grande. Na minha cabeça seria encontrar uma irmã, um irmão, ter alguém. Avós…”.
A história de Luciana é um quebra-cabeça e neste momento, uma única peça está faltando.