CATEDRAL: ‘Meu Deus, que barulho é esse?’

Barulho das ruas avança para dentro da igreja e vem tirando o sossego de fieis e sacerdotes. Sondagem informal confirma que sons vem passando dos limites

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Atualizado há 6 anos

(Foto: Mariana Honesko).
Catedral Sagrado Coração de Jesus em União da Vitória – PR | Foto: Mariana Honesko

Brooommm! Vrom! woo woo woo! São tantos sons diferentes que sim, foi preciso começar a reportagem com onomatopeias, a figura de linguagem que permite, o mais fiel possível, traduzir com letras o que se ouve.  Estes sons traduzidos, podem causar estranheza aqui. Mas, causam muito mais que isso quando estão dentro da igreja.

Esta é a reclamação dos fiéis e dos celebrantes de missas da Catedral Sagrado Coração de Jesus: o som das ruas, produzido por freadas de carros, por buzinas e sirenes, por arrancadas de motor, por motos em maior velocidade, tem sido presença frequente nas missas. Com o barulho, a quietude que se espera para o ambiente religioso não acontece mais.

“Muito barulho. Incomoda, desconcentra”, comenta Helena, que aproveitou à vinda para o centro da cidade para rezar.

Assim, as orações são interrompidas, a mente se distrai e o propósito de estar ali, de joelhos ou simplesmente em silencio, deixa de existir. O som das ruas também vem causando irritação, especialmente entre os sacerdotes, que precisam retomar a ideia dos seus sermões várias vezes ao longo de uma mesma missa, por exemplo.

Padre Silvano, pároco da Catedral Sagrado Coração de Jesus
Padre Silvano, pároco da Catedral Sagrado Coração de Jesus

O sentimento é o mesmo entre as senhoras dos grupos de oração também que, de tanto desconforto, já tem sua reivindicação pronta e transferida para o padre Silvano, pároco da Catedral: o pedido delas, endossado pelo próprio sacerdote, é o de soluções para o trânsito que passa em frente à igreja, no entorno da Praça Coronel Amazonas.

“Nós sempre nos sentimos incomodados com o barulho. Nossa Catedral é histórica, feita pelo Governo do Paraná e como a igreja fica o dia todo aberta, recebe visitantes, pessoas que vem rezar, meditar além dos horários de missas, o barulho dos ônibus e dos caminhões, atrapalha. Temos uma certa dificuldade acústica e isso atrapalha”, afirma o pároco. “Recebemos o pedido das senhoras, que sugerem entrar em contato com a prefeitura para mudar o ponto de parada de ônibus, para que a igreja tenha de fato, um ambiente aconchegante, ficar em silêncio”. Na Catedral, as missas são diárias (em dois horários) e nas quartas e quintas-feiras, são três celebrações.

Compreender a história de União da Vitória ajuda a visualizar melhor como essa organização no local aconteceu. Em 1917, o Governo do Paraná liderou a construção de um pequeno aglomerado de imóveis naquele espaço da cidade. Além da Catedral, ergueu-se praticamente ao lado dela, a Escola Professor Serapião, a prefeitura e, segundo apontamentos dos estudiosos, a delegacia. Mais perto da Catedral, avia ainda o hotel Paraná, imóvel que mais tarde, pegou fogo e deixou de existir. A ideia era de fazer com que União crescesse a partir dali.

“Todas as cidades se formam assim. Porto União foi assim também. É interessante isso, tudo próximo. Após o acordo de limites entre os Estados, isso aconteceu. Esse formato, desse miolo, a parte nervosa da cidade, começou a brotar dali”, conta o historiador, Aluízio Witiuk.

No entanto, o tempo passou, a cidade de fato cresceu, e estruturalmente, pouco foi feito. A Catedral fica em um centro nervoso, de bastante movimento, e sozinha, “se defende” como pode. “Estamos mobilizando a comunidade para que em breve prazo, traga uma solução para ela problemática”, pede o padre Silvano. “A porta fechada, por exemplo, eliminaria um pouco do barulho, mas em todas as celebrações, elas ficam abertas. Isso é até por uma questão cultural, já que se alguém chega para rezar na igreja e as portas estão fechadas, ela se sente constrangida”.

Barulho

A reportagem, auxiliada pelo técnico em Meio Ambiente e em eletrotécnica, Cristiano Silva, aferiu o volume da rua, do lado de fora da igreja e dentro dela, de cima do altar. A sondagem, informal, mas técnica, amparada pelo decibelímetro, confirmou o que os ouvidos da comunidade que frequenta a Catedral já denunciavam: o barulho é realmente alto, acima dos limites permitidos pela legislação sobre o assunto.

Cristiano Silva, técnico em Meio Ambiente e em eletrotécnica.
Cristiano Silva, técnico em Meio Ambiente e em eletrotécnica.

Conforme Silva, a Catedral de União da Vitória, dentro do seu zoneamento ambiental (limites determinados por legislação federal) fica em uma área administrativa/comercial. Nestes locais, o limite do ruído permitido por Lei do ambiente é de 60 decibéis (dB). Este volume é ultrapassado com facilidade, seja por conta do escapamento de carros fora de padrão, pela circulação de veículos pesados ou por conta dos veículos de som.

“Tivemos medições que ficaram acima de 70 dB. Além de ser desconfortável para quem reside, é ruim para quem tem comércio também. Esse ruído que vem de fora, entra na igreja, reverbera e acaba trazendo esse desconforto”.

 

Bloquear o som e deixar o ambiente silencioso na igreja, é uma opção com vários caminhos. Para Silva, por exemplo, uma das alternativas seria fechar a porta da frente e permitir a entrada dos fieis apenas pela lateral. “O som é deslocamento de ar e aonde o ar se desloca, o som vai junto. Então, acaba interferindo”, sugere. O técnico também concorda com a sugestão do grupo de senhoras e com o padre Silvano, de alterar o endereço dos pontos de ônibus. “Não apenas o ruído atrapalhar a igreja, mas o tráfego, acaba danificando até a pavimentação e podem até comprometer a estrutura histórica da igreja. É preciso avaliar todos estes pontos”.

 

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Outra intervenção idealizada pela comunidade paroquiana, é o de um possível avanço da Coronel Amazonas até a porta da igreja, deixando a Catedral em um espaço de circulação apenas de pedestres, como já ocorre em dezenas de exemplos no País e no mundo. Contudo, essa possibilidade, já está descartada.

Conforme o secretário de Planejamento da prefeitura, o recurso que veio para a obra é apenas para a execução das melhorias na praça, sem ultrapassar as dimensões. Sobre a remoção dos pontos de ônibus, Clodoaldo Goetz explica que vai acolher o pedido e levá-lo para uma discussão conjunta, entre os conselhos municipais da área.

Uma das principais queixas da comunidade que frequenta a catedral, envolvem o movimento dos ônibus do transporte público coletivo. Conforme a empresa que administra o serviço, 15 linhas passam em frente à igreja diariamente, em diferentes horários do dia e da noite.