Opinião: “O STF está errado mesmo se acertar”
Nesta última semana, manifestei-me por diversas vezes na imprensa e em minhas redes sociais sobre as medidas de força tomadas pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Trib unal Federal (STF) contra um punhado de empresários bolsonaristas lunáticos que trocaram mensagens de WhatsApp a respeito de um possível golpe, caso Bolsonaro não vencesse as eleições.
Pensei que tinha esgotado o assunto e comecei a rascunhar para este artigo algumas ideias sobre a visita do coração de D. Pedro I ao Brasil. Fiquei curioso ao descobrir, por exemplo, que muitas nações de primeiro mundo costumam preservar os cérebros de grandes cientistas pátrios para estudo, enquanto o Brasil recebe sob aplausos o coração inchado de um imperador: pequenos sinais que explicam nossas grandes tragédias.
Ia por aí meu texto da semana, quando na tarde de sexta-feira o ministro Gilmar Mendes, colega de toga de Moraes, veio a público defender a decisão de seu par, afirmando que as mensagens do grupo bolsonarista indicavam “atos preparatórios” e que adiante os fundamentos completos da medida seriam revelados.
+ Possui alguma sugestão? Clique aqui para conversar com a equipe de O Comércio no WhatsApp
Pois bem, as fases percorridas para a realização de um crime, chamadas no direito penal de iter criminis, são: cogitação, preparação, execução e consumação. A fase de preparação, exceto em casos excepcionais, não pode ser punida. A fase de cogitação menos ainda, pois se confunde com o direito à liberdade de o indivíduo pensar e se manifestar, em observância aos artigos 5º, incisos IV e XIV e 220 da Constituição Federal.
Pensar e dizer uma pérola ou uma cretinice, sozinho ou em conjunto, tanto de um grupo de sábios quanto de um bando de idiotas golpistas, não é um ato preparatório, ministro. Do contrário, estaríamos criando no ordenamento jurídico o crime de pensamento, como bem escreveu Mario Sabino em ótimo artigo publicado na semana. E isso seria impossível sem que antes, de vez, morresse nossa garantia constitucional à liberdade de expressão, que não apenas protege a exteriorização de uma ideia ao público como também todo o percurso de sua concepção.
Na última quinta-feira, a Folha de S.Paulo noticiou que nenhuma outra diligência preliminar havia sido realizada antes de o ministro Moraes autorizar as medidas de busca e apreensão contra os empresários. Ou seja, Moraes teria motivado sua decisão apenas e tão somente em função das mensagens trocadas. O que Gilmar agora dá a entender é que o jornal estaria errado e que o ministro Moraes teria tomado sua decisão com base em indícios que desconhecemos, por estarem as investigações sob sigilo.
Se isso é verdade, a quem o sigilo estaria protegendo? Sua decretação em um caso como esse possui a finalidade de resguardar a investigação. Mas se o grupo de empresários e suas relações já foram devassadas, se suas contas bancárias já foram bloqueadas, se o assunto já é público e está na boca do Brasil inteiro, que investigação, afinal, estaria sendo preservada? O que estaria o ministro Moraes esperando para nos demonstrar que sua decisão não foi atabalhoada? O que estaria aguardando para alertar a população de que temos em meio a uma eleição polarizada grupos de empresários estruturando, de fato, um golpe em favor de um dos candidatos?
Nós, eleitores, temos o direito de saber se temos um STF afoito e que flerta com a abusividade em suas decisões, ou se temos em curso no país realmente um golpe de Estado em favor de um dos líderes das pesquisas.
Aposto minhas fichas na primeira hipótese, mas em qualquer delas, o Supremo erra: ou por tomar decisões precipitadas e equivocadas, ou por nos deixar no escuro em meio a uma trama golpista da qual seus ministros estão cientes e, de forma irrazoável, ocultam de nós.
Voltar para matérias