Opinião: “O Brasil é um país de radicais?”
Dentro dos muros de nossa cordialidade, guardamos um autoritarismo que, se não é causa, é resultado da sequência de golpes que puseram e tiraram governantes pela espada e pela lei, durante toda a história de nosso país. Os poucos que conseguiram até hoje terminar seus mandatos acabaram presos, fugidos ou esquecidos.
O radicalismo introjetado em nossas raízes culturais e sociais impede uma vida democrática mais plena. Quando partidos de esquerda ou de direita se alternam no poder, quem ganha passa quatro anos ocupado em desfazer o que foi feito, acreditando que seus valores são os que importam. O resto é lixo.
A oposição, por sua vez, não busca agregar, mas boicotar de todas as formas a viabilidade do governo eleito. Não há diálogo, mas golpes, denúncias, dossiês e prisões. Governo e oposição no Brasil só se entendem quando um compra o apoio do outro com cargos e benefícios, também algo muito típico de nossa República, em que o dinheiro público é tratado como dinheiro de ninguém; o que é de todos não tem dono.
Natural que chegássemos onde estamos. Os atos radicais de invasão e depredação de prédios públicos, símbolos de nossas instituições, nada mais são do que um passo a mais nessa caminhada autoritária. O mesmo se pode dizer do governo e do Judiciário que parece terem entrado em uma disputa de quem dá a resposta mais dura aos atos do último domingo. O governo determinou a intervenção na segurança pública do Distrito federal, o Supremo Tribunal Federal, mesmo sem ninguém pedir, afastou o próprio governador, algo inédito e muito controverso na jurisprudência do país.
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Amin Malouf, em seu “Naufrágio das civilizações”, afirma que a passagem da barbárie à civilização em uma democracia adulta exige que cada um assuma o conjunto de seus pertencimentos e, ao menos um pouco também, o dos outros. Sem o outro, sem todos os outros, não sobra nada. Não sobrar nada é resultado inevitável dos radicalismos e a face de nossa política degenerada, em que estamos sempre começando tudo de novo, escolhendo o menos pior para tirar do poder o menos pior que foi escolhido antes.
Tomara que a indignação com tanta instabilidade gerada possa nos fazer sentir a urgência de termos vozes mais moderadas na política nacional. Quem sabe o radicalismo, que tanto nos impede de avançar, possa ser a chance de criarmos uma oposição equilibrada. O equilíbrio está sempre em algum lugar – às vezes, no mais inesperado deles.
Espero, sinceramente, que o radicalismo sirva ao menos para nos impulsionar para fora dele.
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