Especial Odilon Muncinelli: Não era só cultura…
Muito já se falou e ainda vai ser dito sobre o quanto Odilon Muncinelli era culto, educado, curioso e de memória invejável. Não vamos chover no molhado. Prefiro descrever o homem que eu conheci. Dizem que a primeira impressão é a que fica. Discordo. A primeira vista, ainda na infância, aquele homem era imponente, muito bem vestido, usando a palavra sempre em eventos sociais e sobre palanques, rodeado de autoridades. Imaginava que ele era meio místico. Sabe aquele tipo de figura intocável que poucos têm o privilégio de atrair a atenção? Simpático e sorridente, porém com uma segurança que assustava uma criança que sabia muito pouco da vida.
Depois de muitos anos, bastante acanhada, fui procurar o afamado Senhor Odilon para pedir conselhos de como escrever sobre a história de Porto União quando tantas pessoas mais experientes do que eu declinaram da missão. Acanhada sim, afinal, como eu poderia convencer àquele homem tão culto, respeitado e conhecido a me ajudar? O que ele ganharia com isso? Porque ele perderia tempo com uma desconhecida?
Que surpresa agradável! E nem vou mencionar seu imenso conhecimento sobre fatos incríveis da nossa história. Refiro-me à generosidade, gentileza e delicadeza com a qual fui recebida. Ele segurava uma linda cuia de chimarrão toda decorada com ervas medicinais e aromáticas, em um escritório aconchegante, repleto de livros e móveis de madeira, com objetos decorativos e quadros com motivos regionais. Tudo ali era agradável e confortável. Era quase possível absorver conhecimento pelo ar. O cheiro dos livros, da erva verde, da madeira… A conversa que, na minha cabeça seria curtinha para não atrapalhar, durou horas. Horas de muitas risadas e causos. Parecia que éramos velhos amigos. Odilon compartilhou muito mais do que conhecimento comigo naquela manhã. Ele me mostrou que lendas vivas também podem ser humanas, humildes, divertidas, generosas e apaixonadas. Sempre que ele falava algo sobre sua vida pessoal, mencionava sua “Nega”, a gatosa* Aldair, com um brilho nos olhos daqueles que emocionam. Como é bonito ouvir um homem se referir à sua esposa e companheira com tanto carinho e admiração. Saí de lá com vontade de permanecer… de voltar. Outras conversas surgiram depois daquele dia, mas poderiam ser tantas mais, já que seu repertório era infinito com aquela lareira quase sempre acesa na sala, tão convidativa.
Dizem que é muito comum uma pessoa ser mais reconhecida depois do seu falecimento. Provavelmente com Odilon não será diferente. Mas quem teve o privilégio de conhecê-lo sabe o tamanho da contribuição que este homem deixou para nossa região. Falo por mim, com absoluta certeza, de que ele foi determinante em minha segurança para pesquisar e escrever sobre nossas belezas. Por isso afirmo: Odilon foi muito mais do que cultura.
Gratidão é tudo que sinto nesse momento de despedida. Até logo, mestre.
*gatosa: contração de gata idosa.
Léia Alberti
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