Opinião: “Regulação das redes não pode ter bicho papão, ministro Barroso”
O ministro Luís Roberto Barroso e sua filha, Luna Van Brussel Barroso, escreveram no domingo, dia 28, no site Poder360, um longo artigo defendendo a regulação da internet. Em resumo, alegam que as democracias eram mais estáveis antigamente, com as vozes do debate público filtradas pela imprensa. Para os autores do texto, com o advento da internet, especificamente das plataformas de redes sociais, impulsionadas por algoritmos gananciosos, deu-se voz ao extremismo de direita.
“Populismo pode ser de direita ou de esquerda, mas a onda recente tem sido caracterizada pela prevalência do extremismo de direita, frequentemente racista, xenófobo, misógino e homofóbico. Enquanto no passado existia uma Internacional Comunista, hoje, é a extrema direita que tem uma grande rede global. A marca do populismo de direita é a divisão da sociedade em nós – o povo puro, decente e conservador – e eles – as elites corruptas, liberais e cosmopolitas”.
Se a separação entre “nós e eles” é uma característica da direita, então nunca tivemos esquerda no país, pois está claro que essa cisão populista é feita também pelas esquerdas: “nós, o povo, eles, as elites”. O governo Lula, toda vez que sobe a um palanque, não me deixa mentir. Também vemos ministros da Suprema Corte dizerem: “nós, os democratas, eles, os fascistas”, e até mesmo: “nós derrotamos o bolsonarismo”. Além disso, é uma visão simplista colocar crimes da internet nas costas de uma ideologia política. Soa contraditório os autores demonstrarem serem saudosos do debate público de outrora e, ao mesmo tempo, reconhecerem que ele era habitado por esquerdas globais com iguais características com que pintam a direita hoje.
E o problema da regulação brasileira está justamente aí. Quando se acredita que as redes são um canal para crimes associados à direita, advoga-se em favor de uma regulação política, não jurídica, que implica silenciamento das oposições. Não há um populismo ou extremismo melhor ou pior à direita ou à esquerda. O debate público sequer era melhor no Brasil antes das redes; apenas menos caótico, por estar centralizado na imprensa. Algo que não necessariamente era mais democrático, ao contrário, sempre foi alvo da crítica da própria esquerda que alegava que o debate dependia do interesse das poucas famílias de oligarcas da mídia.
O artigo tem lampejos técnicos interessantes, ao admitir possibilidades como a autorregulação ou a corregulação, tirando um pouco do colo do Estado – especialmente do Judiciário – a carga de nos dizer o que deve ser o debate público nas redes. O ponto que escapa ao ministro Barroso, no entanto, é que se a premissa do argumento técnico é política, a técnica se perde, transformando o debate sobre regulação em uma mesa redonda de futebol, em que somente paixões são discutidas. É inviável uma regulação que pressuponha que a direita é um bicho papão das redes sociais. Nessa toada, ministro, regular significará controle político da oposição e será nociva ao Brasil.
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