Opinião: “As razões do voto”
Importante iniciar registrando que candidatos são próximos e conhecidos nas eleições municipais, por isso os critérios de definição de voto são alterados em relação aos pleitos nacionais. A afinidade talvez responda por 80% das escolhas, acentuando a prioridade do emocional sobre o racional em qualquer pleito eleitoral.
A verdade é que um cafajeste simpático vai ganhar quase todas de um competente sem empatia e não há nada, fora de espectro do marketing, que consiga alterar isto. Talvez esteja na hora da sociedade atentar para isto e construir atalhos inteligentes que permitam desnudar os candidatos de sua roupagem desenhada em detalhes pela estratégia da campanha.
Outro detalhe é que já virou regra não escrita; quem está na frente, não participa de debate para minimizar riscos e, por consequência, quem está atrás, mesmo sem armar o jogo, se divide em levantar a bola e atirar no líder ausente.
Talvez seja a estratégia possível, admito, mas, para o eleitor sedento de informações, isto não se transforma em instrumento efetivo de avaliação de nomes. Importante também registrar que a campanha cada vez mais curta, menos de quarenta dias de palanque eletrônico, que é o referencial tradicional de início de campanha para a população, se tornando cada vez mais fácil disputar eleição tangenciando temas importantes, sem assumir compromissos, sem correr riscos e impedindo que o eleitor tenha informações que lhe permitam uma escolha sensata.
Cobrir-se de um bom verniz social, mascara defeitos com eficiência e ilude o eleitor comum, louco para ter alguém que lhe conceda esperanças de resolver suas demandas e expectativas e, provavelmente este raciocínio indique um caminho a ser percorrido.
Todo mundo tem suas prioridades, ditadas por sua realidade social ou por suas preferências pessoais. De modo genérico, as expectativas de melhorias se concentram em poucos itens: saúde, emprego, infraestrutura, segurança e educação, em ordem diversa determinada pelas necessidades pessoais ou geográficas do eleitor.
Uma leitura isenta dos discursos dos candidatos oferece uma homogeneidade que assusta; todos darão prioridade para todos estes itens e vão resolvê-los com agilidade, segundo planos e ações nunca reveladas. É, geralmente, um discurso vazio, até admito que cheio de boas intenções, mas desprovido de nexo causal. Na prática, é a capacidade do candidato de gerar credibilidade ao emitir estas declarações que se transformam em votos, não são contestados, não se questiona sobre caminhos, capacidade financeira ou qualquer registro que permita acreditar na transformação de discurso em prática efetiva.
O eleitor não se dá conta da síndrome do cobertor curto que assola quase 100% das prefeituras: os recursos são limitadíssimos, não sobra nada para investimentos e obras dependem da boa relação com deputados que conquistem recursos estaduais ou federais. Portanto, as promessas são apenas instrumentos de convencimento eleitoral, nem mesmo os candidatos acreditam nelas, embora uma parcela substancial do eleitorado defina seu voto, iludido pela avalanche de promessas.
Planos de governo são falácias habilmente montadas por um ou dois assessores qualificados, perfeitamente alinhadas com o marketing e desconectadas com a realidade financeira do município. Com boa vontade, se pode entendê-los como um conjunto de intenções e que, de maneira efetiva, podem apenas apontar quais as áreas prioritárias das ações projetadas, embora até estas sejam definidas pelas pesquisas qualitativas e buscam muito mais responder aos anseios mais fortes do cidadão.
Então não tem jeito? Deixa rolar que o teatro eleitoral definirá os atores mais talentosos? Talvez não precise ser assim, mas isto exige participação efetiva da sociedade civil na campanha, assumindo a responsabilidade de sabatinar candidatos, traduzindo as suas reais intenções, suas bandeiras genuínas e sua capacidade gerencial.
Sem intervenção, a agenda da campanha será uma sucessão de fatos de apelo eleitoral ou para gerar imagens para o palanque eletrônico e das redes sociais. Raramente, o candidato quer contestação, debate aberto com o eleitor ou mesmo trocação direta com os oponentes, cabendo à sociedade criar mecanismos que nos ajudem na definição racional do voto ou, pelo menos, na possibilidade de eliminar nomes que não associem talento às ideias.
Não é uma missão fácil. Associações de profissionais liberais, comerciais, de bairro, clubes de serviço são obviamente compostas de gente comprometida com candidaturas, principalmente nos centros menores, e quando não o são, raramente querem se submeter ao desgaste de confrontar candidatos, sabendo que um deles terá caneta por quatro anos.
Sinceramente não conseguiria desenhar uma forma adequada e universal para uma filtragem satisfatória dos candidatos, mas afirmo que as pessoas com representatividade social precisem entender suas responsabilidades neste processo e programar situações onde se faça um teste efetivo do potencial de cada postulante ao cargo mais importante do município.
Talvez não mude substancialmente a prioridade da escolha emocional, ditada por fatores pessoais, mas pode significar a eliminação de alternativas sem competência para cuidar da cidade por quatro anos.
Se você pensar bem, só por isso já vale o esforço e comprometimento da sociedade civil, certamente é bem melhor que o arrependimento de uma péssima escolha.
E aí? Vamos apertar os candidatos?
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