Opinião: “O pior da censura ainda está por vir”

Não sou bom em Física, mas sei que tudo que estica uma hora volta ao estado normal. É assim com o elástico de um estilingue, e também será com os exageros abusivos de nossa mais alta Corte.

O problema é que, diferentemente do elástico do estilingue, os abusos deixarão marcas eternas em todos nós. Já faz dois anos que o STF está julgando senhoras de idade e pipoqueiros que estavam nos atos do dia 08 de janeiro por golpe de Estado. E ainda falta muito. Faz mais de cinco anos que o STF abriu o inquérito 4781, chamado das Fake News, e o desdobrou em uma dezena de outros procedimentos. E não há notícia de que pensa em os encerrar.

Ou seja, uma criança que em 2019 tinha treze anos, hoje está com dezoito, em um banco universitário, tendo passado toda a sua vida intelectualmente ativa acreditando que é normal uma Corte constitucional ser dotada de competência para investigar tudo e todos a qualquer momento, que é natural depredação de patrimônio público e baderna serem tratados como um golpe de Estado e terrorismo, que ministros palpitarem na vida política do país faz parte do jogo, que políticos terem imunidade parlamentar apenas para falar bem de governantes e juízes é o caminho certo. E crendo também que censura higieniza o debate, que liberdade de expressão é um perigo e que a direita tem um discurso extremista.

Um amigo empresário, outro dia, me contou que, ao visitar a China, ouviu um jovem lhe dizer não sentir falta da liberdade. Segundo ele, preferia a harmonia social proporcionada pelo Estado à liberdade. Com efeito. Quem nunca soube o que é liberdade não terá mesmo condições de acreditar em sua importância. Eu nunca tive um uma mansão de frente para a praia e facilmente concluo que seja desnecessária à minha vida.

No Brasil da censura, o pior ainda está por vir. Quando o autoritarismo abusivo dos inquéritos e dos famigerados julgamentos passar, teremos de herança uma jurisprudência agressiva e uma juventude conformada a ela. Jovens acreditando que é dessa forma que se faz justiça no país e que é a isso que se deve chamar de democracia. Estes mesmos jovens serão os próximos quadros a ocuparem cargos no governo e na política, nas empresas e nas cadeiras do Judiciário. Serão os próximos jornalistas, articulistas e advogados. Formarão a massa crítica do país, emburrecida por uma cultura autoritária decorrente do período que estamos vivendo neste exato momento.

Quando houver o recuo do estilingue do STF, o estrago já estará feito. Meus textos estarão em uma gaveta, em uma estante, dentro dos livros empoeirados que escrevi. Os jovens, como é natural, preferirão lidar com a realidade prática de seu tempo, antes de lidar com a memória do nosso. Sem que vejam, sem que sintam, sem que notem, tudo de bizarro, autoritário e censório estará normalizado.

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