Opinião: O PT refém de Lula

Se o referencial fosse apenas número de prefeituras, talvez nem houvesse preocupações, afinal eram 227 e agora são 241 comandadas pelo PT, mas está ligado o farol amarelo na trajetória do partido que, mesmo no governo, sai das urnas menor do que em 2020 ou 2022.

O PT refém de Lula

Em queda desde 2016, fruto do desmonte promovido pela Lava Jato, a expectativa era de um desempenho turbinado pelo comando do governo federal, fato que as urnas não comprovaram. Ainda que os números absolutos, a leitura não seja grave, já que o partido disputa quinze eleições em segundo turno, quatro delas em capitais, o ajuste fino demonstra maior preocupação.

Nas capitais, ainda que quatro disputas sejam razoáveis, em apenas uma delas, Fortaleza, tenha atingido mais de 30% dos votos (34,88%, com precisão), largando em muita desvantagem nas demais Porto Alegre (49,82 x 26,28), Natal (44,08 x 28,46), Cuiabá (39,61 x 28,30), sendo mais razoáveis apenas na capital cearense onde o adversário soma 40,33%. Em condições normais, os adversários devem vencer todos os pleitos.

Nas grandes cidades, o PT também não teve comportamento razoável, principalmente porque foram inúmeras situações em que transferiu o bastão para siglas aliadas para minimizar o risco, deixando evidente que assume a rejeição da sigla e não possui força para enfrentar as ruas, sendo este o principal problema.

Lula se omitiu das eleições, priorizou a pauta externa, talvez como estratégia para poupar companheiros e aliados, mesmo com Guilherme Boulos, que largou com número elevado em São Paulo, o presidente marcou pouca presença, não sendo capaz de garantir crescimento eleitoral.

Se comparado com o rival Bolsonaro, a defasagem é evidente. O ex-presidente sai das urnas do primeiro turno com muito mais razões para comemorar, com algumas vitórias em capitais e nove disputas em segundo turno, todas muito competitivas.

A direita cresceu, mas ainda assim foi o centro que obteve os melhores resultados, montando um ótimo cenário para as eleições seguintes. Só resta ao PT cooptar o centro para ter competitividade em 2026.

Para quem tinha dúvidas, os resultados comprovam a tese de que Lula, e não o PT, venceu em 2022, quando enfrentou um adversário que padecia do mesmo problema; rejeição elevada e foi este fator que garantiu a vitória, mas em 2026 será diferente.

Ainda que com a possível divisão da direita, atormentada pelo furacão Marçal que, se não for cassado, é presença certa na disputa presidencial, inclusive cacifado por sigla mais expressiva, União Brasil como prioridade e assim como em São Paulo, uma disputa tríplice surge como hipótese no horizonte político e, neste caso, a tradicional polaridade pode ser arrastada apenas para o segundo tempo da disputa.

O tempo encurtou e o PT precisa entender o recado das urnas e se organizar para as próximas eleições, em que até o risco de ficar fora do segundo turno pode lhes tirar o sono. É urgente uma revisão de rumos em várias frentes.

A questão fundamental é que Lula precisa largar o egocentrismo que o faz se isolar e não permitir que absolutamente ninguém lhe faça sombra. Atua como um poderoso chefe autoritário, fato que se evidencia até no destaque político da primeira-dama Janja, sempre mais proeminente que qualquer ministro. As eleições municipais acentuaram este vácuo de lideranças petistas, enquanto a direita desfila com Tarcísio, Caiado, Ratinho, Zema e até Marçal, todos aptos e dispostos para 2026, na esquerda a fila segue vazia.

Sem nomes petistas, preteridos agora, siglas parceiras tendem a ocupar cada vez mais espaço, desenhando um cenário complexo em 2026. A prioridade absoluta, como sempre, será Lula e o PT terá que abrir espaços nas disputas de governo e senado, como forma única de ampliar as possibilidades eleitorais. Muito mais que agora, nomes petistas seguirão em segundo turno porque tudo que importa é o projeto de Lula. Estejam certos: esta estratégia tem um custo elevado que talvez seja cobrado em 2026, mas certamente o será em 2030, basta observar o processo de inanição tucana, outrora expoente da cena política.

Se a mudança de estratégia é necessária, para dividir holofotes novos nomes da esquerda, a questão é bem mais profunda e exige uma correção drástica na comunicação do governo. Notem que, mesmo com desemprego no piso inferior, inflação sob controle, PIB crescendo acima das expectativas, enfim um conjunto de números significativos, Lula nem mesmo consegue percorrer as ruas como seus adversários.

Lula precisa ajustar as suas pautas. Abusou da paciência da população com seus delírios democráticos com Maduro, insistiu em temas como a crise de Gaza e prioriza temas internacionais, distantes da angústia da população, que enfrenta dificuldades prementes, ou mesmo da elite econômica, e mesmo da comunidade internacional, que não sente segurança em investir no país.

O primeiro tempo se encerra com resultado adverso. Lula e o PT tem pouco tempo para reverter a situação que, sem mudança radical na comunicação do governo e na postura do presidente, parece inviável. Sem isto, resta apenas torcer para que a direita não construa consenso em torno de um único nome que os coloque como favoritos inquestionáveis para 2026.

Talvez seja melhor torcer para que Marçal também não fique inelegível…

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