Adolescentes do Vale do Iguaçu conquistam Campeonato Paranaense de Karatê

Enzo Milezi, Andrei de Souza Scheid e Luiz Felipe da Cruz têm algo em comum. Todos os três são pré-adolescentes que dedicam parte de suas rotinas ao esporte, mais especificamente ao karatê. Passam algumas horas da semana se empenhando nos treinamentos na Associação União de Karatê, em União da Vitória. E o esforço, a dedicação, a disciplina e o talento os levaram ao lugar mais alto do pódio. Enzo, Andrei e Luiz Felipe são campeões paranaenses em suas respectivas categorias. Títulos conquistados na última etapa do estadual, disputada nos dias 30 de novembro e 1º de dezembro em São José dos Pinhais, na região metropolitana de Curitiba. Cada um com a sua história, mas com o mesmo objetivo de vencer no esporte e, consequentemente, tirar lições para a vida.

Adolescentes do Vale do Iguaçu conquistam Campeonato Paranaense de Karatê

Foto: JOC

Enzo Milezi foi campeão paranaense na categoria junior +55kg. “Eu não queria entrar no karatê, não queria nem passar perto. Até que um dia a minha mãe disse que nós iríamos dar uma volta. Saímos da igreja e ela me levou lá (na Associação União de Karatê). Parei na frente do dojô (espaço físico onde se pratica artes marciais) e não queria ir. Aí meu pai falou: ‘desça’. Eu desci, bem tímido e envergonhado. Chegou o sensei e pediu para eu tirar o tênis e entrar. Fui de calça mesmo, com vergonha. Mas desde o início a equipe foi muito acolhedora comigo”, conta Enzo. Segundo ele, esse fator acabou sendo fundamental para a continuidade no karatê. “Eu sofria muito bullying antigamente na escola. E eu me senti acolhido na associação, isso te ajuda, te incentiva, me senti feliz com esse acolhimento”, relata o campeão, demonstrando uma maturidade admirável.

“Parei de fazer tênis de mesa, parei de jogar futebol e foquei no karatê porque eu sei que tenho potencial para isso. O que eu tenho de foco principal hoje, fora os estudos, é o karatê. Eu pretendo seguir em frente, talvez virar um atleta profissional, mas sempre conciliando com os estudos”, acrescenta Enzo. Para 2025, o objetivo é manter o título estadual. “Esse ano foi minha primeira experiência em um campeonato desse nível. E foi de grande superação para mim e para minha família. Eles me acompanharam e isso é muito gratificante. O conselho que eu deixo para as crianças e adolescentes que não praticam nenhum esporte é o seguinte: ‘levanta, toma coragem e faz porque vale a pena’”.

Luiz Felipe da Cruz venceu o Paranaense na categoria Sub-14 até 50kg. E o mais impressionante é que ele começou a lutar há pouco mais de um ano, já conquistando um resultado muito expressivo. “Eu não imaginava chegar tão longe já de início. A minha mãe sempre me incentivou a praticar esporte. Eu tenho um amigo que se chama Pablo, uma vez nós estávamos na escola e ele falou que ia começar a fazer karatê. Eu falei que iria junto, fui a primeira vez e nunca mais parei”, conta.

Ao conversar com esses atletas tão novos, percebe-se que todos têm na família a principal incentivadora. No caso de Luiz Felipe, a influência na escolha pelo karatê partiu de um amigo da escola, mas o esporte sempre foi sugerido pela mãe, como ele mesmo relatou. “A minha luta mais complicada no Paranaense foi contra o karateca que era o atual campeão da minha categoria. Depois que eu recebi minha medalha, fui contar para a minha mãe que eu tinha vencido e ela me deu os parabéns, ficou muito orgulhosa de mim”. O Campeonato Paranaense é disputado em três etapas classificatórias e mais uma etapa final, com pontuação dobrada.

“Eu penso em ser um grande campeão, ganhar muitos títulos, quero fazer a seletiva ano que vem para a seleção brasileira. Eu penso em ser campeão mundial, chegar numa Olimpíada”, diz o garoto de 13 anos, que já foi vice-campeão brasileiro e vislumbra um futuro vencedor no esporte.

Alimentar sonhos também é algo inerente ao esporte. São meninos e meninas que encontram no karatê um estímulo para desenvolver seu lado competitivo. E mesmo que não venham a alcançar os resultados sonhados, serão cidadãos mais conscientes e preparados quando chegarem à vida adulta. “O karatê ajuda muito na disciplina e no controle. O sensei é a pessoa que vai te ajudar a dar os passos certos. Para ser um bom karateca, primeiro você tem que ter uma família que te apoia, que é um apoio psicológico. Depois, se alimentar bem para ter bom rendimento e, claro, treinar muito”, diz o atleta Andrei de Souza Scheid, campeão paranaense na categoria júnior até 67kg.

“Eu comecei a fazer karatê durante a pandemia. Lembro que a gente treinava de máscara e era um terror aquilo porque não dava para respirar direito. Escolhi o karatê porque era algo que eu nunca havia experimentado, eu queria um esporte diferente. Eu estava muito parado, acima do peso, daí fui começando e na primeira aula o sensei disse que eu levava jeito. Isso me incentivou a treinar mais e mais”, destaca Andrei. “Eu estava há algum tempo querendo esse título porque sempre que eu chegava próximo da conquista acontecia alguma coisa que me atrapalhava. Mas esse ano eu consegui”, completa.

O projeto do Sensei

Ele é a principal referência. Os jovens atletas citam o sensei a todo o momento durante a entrevista. Nesse caso, trata-se de Wlademiro Parastchuk Junior, o professor que acolhe, ensina, incentiva e comemora os resultados dos seus pupilos. Mas é impossível falar de “Wlade” como é conhecido no Vale do Iguaçu sem contar a história da Associação União de Karatê e do projeto que lá é desenvolvido. Não é apenas um local onde se pratica esporte, e sim uma instituição que tem no lado social seu principal propósito. Depois de ter sua sede em três locais diferentes, hoje a Associação União de Karatê tem uma sede bem estruturada na rua Expedicionários, no Bairro Nossa Senhora do Rocio, em União da Vitória. São 16 anos de luta e mais de 400 crianças e jovens matriculados ao longo dessa trajetória.

Existem os alunos das turmas particulares (pagam mensalidade) e aqueles do projeto social, que vivem em situação de vulnerabilidade. “As competições são importantes, claro que nós queremos ganhar, competir, viajar, eles têm um crescimento grande na parte esportiva. Mas o que nós almejamos, através do esporte, é proporcionar inserção social, oportunidade de crescer como pessoa. Eu quero que eles continuem se esforçando, se superando, melhorando a cada dia. Todos eles, e hoje são mais de 60 alunos, eu considero parte de mim, é como se fossem meus filhos”.

Entre os “filhos” do sensei está a pequena Rebeca Gomes de Melo, que luta na categoria sub-12 até 40kg. “Eu iniciei no karatê também durante a pandemia. Entrei por causa do meu irmão, que já fazia. Fui lá só para ver ele, mas o sensei perguntou se eu não queria fazer uma aula experimental, fiz e me apaixonei. Estou firme até hoje. O karatê mudou muito a minha disciplina, a minha forma de pensar, muita coisa no meu dia a dia”, destaca.

A associação se mantém não apenas com as mensalidades das turmas particulares, mas também com a ajuda de empresários e do poder público. “Os próprios atletas vão em busca de patrocínios, eles não tiram praticamente nada do bolso. Hoje nós temos um repasse de verba da Assistência Social, recebemos bastante ajuda da prefeitura como o custeio do transporte, que é o elemento mais caro para ir a um campeonato. Tem bastante custo, materiais, inscrições, alimentação, mas no final a gente vê que vale a pena manter o projeto de pé e ver esses jovens motivados a participar”, relata Wlademiro.

E não basta ser um atleta disciplinado para estar matriculado na Associação União de Karatê. Também é preciso ser um bom aluno. “Tanto nas turmas particulares quanto nas do projeto social, a gente cobra bastante. No final do ano, se reprovar na escola, é convidado a se retirar do projeto social, não tem justificativa do porque não estudar. O estudo, a disciplina e o respeito fora do dojô é o principal. Casos de indisciplina, má conduta, a gente chama os pais para conversar”, afirma o sensei.

Ao longo dos anos, são muitos resultados expressivos. Entre 2022 e 2023 a associação teve uma atleta campeã brasileira invicta, que ao completar 16 anos precisou deixar o karatê de lado para começar a trabalhar e dar ênfase aos estudos no Colégio Militar. E são as histórias que envolvem vitórias pessoais que provocam mais emoção no sensei. “Ano passado nós estávamos em Joinville para o Campeonato Brasileiro e lá eu encontrei um menino que foi meu aluno. Um menino do Bairro Rio D’Areia, uma região pobre, um menino que morava em condições de extrema pobreza, a casa não tinha banheiro para se ter uma ideia. E hoje ver ele trabalhando em uma multinacional do ramo de transportes em Joinville, formado em uma faculdade, e te dizer: ‘professor muito obrigado pelos ensinamentos, até hoje eu lembro que eles ajudaram a mudar minha vida.’ Então, às vezes você recebe mensagem no facebook de um ex-aluno e vê que a pessoa foi transformada através do esporte, eu sou apenas uma ferramenta. Eu falo que a transformação são eles que vão fazer”, completa o sensei.

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