“Fake News não são exclusividade dessa década: quem é que nunca ouviu falar que gato preto dava azar?”

Bianca Pinto Vieira, PhD e cientista de dados em Santa Catarina, comentou os desafios dos divulgadores científicos na pandemia da Covid-19


(Foto: Isabella Mendes)

Os efeitos da pandemia da Covid-19 são inúmeros, especialmente quando se trabalha diariamente no campo da divulgação científica, tanto na prática quanto na teoria. A PhD e Cientista de Dados em Santa Catarina, Bianca Pinto Vieira, acrescenta que diversas áreas foram afetadas desde março de 2020, a começar pela ciência; mais de 90% da produção de ciência no País se uniu no esforço de mapear casos e estabelecer cenários sobre a epidemia, produzir insumos para testes, realizar a testagem, pesquisar sobre as melhores formas de prevenção e sobre a eficácia de possíveis tratamentos de combate à doença respiratória.

De acordo com Bianca, o conhecimento produzido no Brasil e no exterior estão sendo instantaneamente compartilhados.

“A ciência se destaca pela parcimônia e sua retidão técnica, ou seja, ela não tem influência de opiniões e analisa as hipóteses, independente de qual seja a sua crença. É uma área extremamente demandada no mercado. No caso da pandemia, o cientista de dados consegue apresentar informações relevantes e muita inteligência. Hoje, por exemplo, existe um grupo de cientistas que monitora a Covid em tempo real, no Brasil e no mundo”, explica.

Em geral, o grupo de cientistas é formado por físicos, matemáticos, biólogos, médicos, entre outros, que busca avaliar a evolução da Covid-19 por meio da ciência de dados. Intenção é traçar o melhor cenário possível de previsão dos casos.

Para Bianca, desde os primeiros casos da doença respiratória no Brasil, os profissionais da ciência vêm trabalhando diariamente para informar a população da maneira acessível, objetiva e séria.

“As Fake News não são exclusividade dessa pandemia e tampouco dessa década; quem é que nunca ouviu falar que gato preto dava azar? O que acontece é que existem absurdos sendo contados desde muito tempo”, lembra.

De acordo com a cientista, diferentemente do aparecimento de outras doenças, desde o início da pandemia, o primeiro passo a ser definido pelos cientistas foi um acompanhamento diário e em tempo real das informações sobre o coronavírus.

“Existem grupos trabalhando no mundo inteiro, tanto no setor privado, quanto no governamental. A pandemia é uma variável de grande impacto na sociedade e que mudou o jeito de atuação em vários segmentos, ou seja, surtiu impacto para todos. Hoje já se sabe muito sobre a doença, porém, lá no seu início não se sabia quase nada, era tudo feito no escuro e haviam muitas comparações com outros vírus e também doenças respiratórias. Aos poucos esses dados foram revertidos em inteligência às instituições e organizações. Tudo o que sabemos hoje dependeu das informações que foram trazidas naquele momento, lá no início, e que, conforme a situação foram se modificando”.

Na prática, a ciência aplicada durante a pandemia depende do protocolo de cada país e também da Instituição mantenedora. Porém, segundo a cientista de Santa Catarina, basicamente todos os profissionais atuam coletando informações na ponta, ou seja, a primeira informação sobre a Covid-19 vem do enfermeiro ou técnicos em enfermagem das unidades de saúde ou hospitais que transcrevem para as fichas e as enviam à Secretária de Saúde e, após repassam para o Ministério da Saúde.

“Isso acontece basicamente em todos os países. No Brasil os dados sobre a Covid foram disponibilizados em todos as instâncias da saúde, pois é uma questão de transparência e controle mútuo. Após, a coleta de informações da Covid anotados lá na base (Unidade de Saúde) são trazidas para nós (cientistas de dados) no qual analisamos todos os possíveis ruídos na informação, como em situações de fichas duplicadas, informações repetidas, algoritmos para serem revisados, enfim, passamos um pente fino em toda a informação. É por isso que em muitas vezes a população questiona as oscilação nos dados da Covid-19, como já aconteceu em Santa Catarina, na França, na China, entre outros. Na ciência não podem escapar ruídos de transmissão dos dados”.

Bianca Pinto Vieira, PhD e cientista de dados
em Santa Catarina (Arquivo Pessoal)

De maneira estadual, conta ela, os governos disponibilizam dados com foco epidemiológico, óbitos, vacinação, números de casos, classificação etária, e outras variáveis, conforme a situação local ou regional e, que possam despertar análises para especialistas da área mais profundamente.

“No nosso caso é disponibilizado o endereço eletrônico coronavirus.sc.gov.br que dispõe de ferramentas sobre a doença nas cidades de Santa Catarina. Atualmente, em detrimento de outros tempos, as publicações científicas acontecem em formato online e disponível para qualquer pessoa. Existe um profissionalismo na hora de ler esses materiais enviados pelos municípios e também um ciclo de maturidade desses dados, sempre de olho nas publicações acadêmicas sobre o assunto na atualidade. A ciência está em todo o lugar, na tecnologia, na roupa, no remédio, tudo é produto da ciência. A ciência faz parte do cotidiano das pessoas. A sociedade só está no ponto que está de desenvolvimento por conta da ciência. O cientista não é só um cara de jaleco branco, mas sim é o profissional que conjura hipóteses que faz experimentos para testá-las e que discute os resultados; ainda, analisa e considera os contextos que esses dados estão inseridos”, pontua.


Ciência no Brasil é valorizada?

“Na verdade a valorização é uma questão cultural sobre o entendimento da utilidade daquele setor. No Brasil, ela é super valorizada para determinadas áreas, como por exemplo na agricultura e a exploração mineral, estes segmentos recebem investimentos e se destacam mundialmente por meio de suas pesquisas. Tudo é uma questão de entendimento sobre a aplicação da ciência na sociedade e depende como acontece a conjuntura dos investimento e da estrutura de gestão. Faz parte da rotina científica explicar as informações o mais claramente possível. Nós evitamos falar em progressões sobre a pandemia, até porque são análises com intervalo de confiança muito grande. É muito provável que a máscara se torne um item permanente na sociedade no pós-pandemia, não para o uso constante, mas quando se sentirem doentes irão usá-la para não passar adiante. Estamos sim em um ritmo de adaptação e transformação”.

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