“Luxo é você sair do trabalho e ficar louco de vontade de retornar à sua casa”

Há 25 anos no ramo, arquiteto afirma que morar bem é um privilégio. Para o especialista, maior luxo é o conforto


Em seu escritório, Murilo Kürten dos Passos está rodeado de ideias. Há 25 anos ele trabalha com o sonho das pessoas. Segundo ele, é o olhar do arquiteto na conquista da casa própria.

Ele vai além: quem nunca imaginou estar morando em um local aconchegante, com janelas coloridas ou de apenas uma cor, com flores no jardim, e reparando na pilha de tijolos que se transformam em um lar?

É para essas pessoas que Murilo dedica o seu tempo e conhecimento. “Colaboro com esse empurrãozinho na realização da casa dos sonhos, pois eu sempre digo que o luxo da atualidade é justamente morar bem; o luxo é você sair do trabalho e ficar louco de vontade de retornar à sua casa. Esse luxo não está atrelado aos materiais caros, pois não precisa ser complexo e de alto custo para ser sofisticado. Uma moradia de luxo necessita ser aquilo que o cliente deseja e hoje dispomos de um repertório bem interessante para que o ambiente tenha a cara do seu dono”, diz.

Murilo Kürten dos Passos possui graduação em Arquitetura e Urbanismo pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná, é especialista em Arquitetura pela FAU/UFRGS e ampla experiência na área, planejamento e obras com ênfase em projeto de arquitetura residencial de pequeno, médio e grande porte, atuando principalmente nos seguintes temas: arquitetura, construção, planejamento de obras, interiores, consultorias e cursos específicos.

Durante a sua caminhada profissional, o arquiteto já vivenciou desafios que foram se apresentando ao longo da história, além de inúmeros serviços residenciais e comerciais para atender grandes grupos empresariais instalados no Planalto Norte Catarinense e regiões Sul e Sudeste do Paraná.

Com atuação também no Vale do Iguaçu, desde 2020 Murilo fixou moradia em Ponta Grossa (PR), em busca de aprofundar a inovação em um mercado que é visto por ele como promissor; com intuito de apresentar soluções criativas, inteligentes, práticas e acessíveis como a parte principal do seu método de trabalho.

Segundo o especialista, o fato de ajudar a construir sonhos é uma missão. Acredita ainda que houve na arquitetura uma evolução e que engloba tanto os novos materiais que surgem a cada período, como os novos modos de vida da população. Como exemplo de mudança, Murilo cita a diminuição no número de integrantes nas famílias que fez com que o número de quartos necessários em um apartamento ou casa ficasse ainda menor.

No meio desse caminho, comenta que o conforto ganhou uma aliada: a tecnologia. “Na atualidade, a tecnologia anda lado a lado com a arquitetura.  Tudo começa com um bom projeto de arquitetura, isso é inegável. A partir disso, o estudo serve como mitigador para que aconteça a economia de energia de uma casa. O que eu quero dizer é que um lar bem projetado minimiza o aumento do consumo da água quente, do ar condicionado, da calefação, ou seja, o conforto humano também está relacionado a eficiência energética, que é um tema em voga na hora de construir, especialmente nos países mais avançados em tecnologia e que se utilizam de recursos nas residências como painel, madeira, estrutura metálica, gessos e a utilização de camadas de isolamento entre as paredes. São recursos utilizados com base ao nosso modo de viver”, afirma.

As características da arquitetura brasileira evoluíram. O Neoclássico é visto com frequência em palácios, prédios e outras construções oficiais e urbanas. No entanto, no interior do Brasil, o Barroco e o Rococó tiveram uma grande influência. O Barroco também é bastante identificado na arquitetura religiosa (sacra) do Brasil, em especial na segunda metade do século XVI. Outro momento importante, depois da influência modernista a partir da segunda metade do século passado o Brasil se tornou um polo desse estilo, tendo como figura emblemática o mestre Oscar Niemeyer.

Casas quentes e frias. O que significa?

De acordo com Murilo, tudo depende de uma boa visão do que o cliente quer alcançar na construção. “É um assunto bem genérico, pois tudo depende do lugar em que a casa estará situada. Uma casa boa e bem projetada não necessariamente precisa ser cara, mas sim ter uma boa relação com a iluminação natural. É preciso ter uma boa visão do espaço, acompanhamento e planejamento de obra. Tenho dito que tudo começa com o projeto. Uma casa bem projetada e bem construída precisa estar bem colocada no terreno e se utilizando da luz solar, ventilação e  iluminação natural. A quantidade de luz do sol que entra pelas portas e janelas é determinante para definir se uma casa ou um apartamento é quente ou frio”.

O arquiteto destaca também outros três fatores que influenciam na sensação de conforto térmico: a temperatura, a umidade relativa e a velocidade do ar dentro de um ambiente construído. A escolha adequada de materiais para pisos e cortinas pode amenizar o desconforto em casa frias. “União da Vitória, por exemplo, é uma cidade úmida e que se polarizam algumas questões relacionadas ao conforto ambiental da casa, pois é comum as paredes suarem em razão da predominância de grande quantidade de ar úmido e diferenças bruscas de temperatura”.

Acústica na arquitetura

“É muito importante pensar no isolamento acústico de uma construção, especialmente porque a densidade habitacional está aumentando, ou seja, mais pessoas e menos área; isso aumenta a geração de ruído porque as pessoas estão mais perto umas das outras. O isolamento acústico ajuda até para evitar estresses desnecessários entre as pessoas”.

O isolamento acústico é uma tendência na arquitetura, pois é a capacidade de um material bloquear o som ou ruído entre diferentes ambientes. Para o arquiteto, os ruídos indesejados podem trazer efeitos extremamente negativos ao organismo humano, tais como perda auditiva, doenças cardiovasculares, hipertensão, dores de cabeça e desconforto em geral. “Existem soluções bem simples como a utilização de tapetes, cortinas, sofás que agem como elementos que diminuem a velocidade das ondas e também da propagação do som. A maioria busca por um lar com o tão sonhado silêncio dentro de casa”.

De acordo com a arquiteta Paula Martins, mestre em Conforto Ambiental, existem duas frentes para tornar um ambiente silencioso, que são frequentemente confundidas: o isolamento acústico e o conforto acústico. Se a questão é o ruído externo ao apartamento ou a transmissão de barulho de um espaço para outro, é necessário trabalhar o isolamento acústico. “O ideal é que, antes mesmo de começar a reforma, o arquiteto já identifique essas fontes de ruído para minimizar o problema, evitando, por exemplo, a abertura de vãos nas fachadas expostas ao barulho indesejado”.

Segundo ela, as soluções para o isolamento acústico são mais custosas por envolverem reformas estruturais, como paredes duplas, portas e janelas acústicas, mantas resilientes, entre outros. “Contudo, é possível atenuar o barulho fazendo barreiras acústicas simples, como plantas que criem um volume entre a fachada e a fonte do ruído. Os jardins verticais, quando posicionados de maneira estratégica, também podem impedir a reflexão do som, absorvendo estes ruídos externos”, afirma a arquiteta.

Murilo acrescenta que nunca se listou tantas opções de acabamentos e finalização de uma obra como atualmente. “Temos uma gama muito grande em material para fazer a composição e a combinação de um ambiente. O legal disso tudo é que você não precisa de materiais caros para se ter um resultado interessante. Temos um leque de opções no mercado e de baixo custo. A construção é uma cadeia produtiva e que movimenta inúmeros setores de negócios, como instalações elétricas, hidráulicas, entre outros”.


A construção tradicional está condenada a desaparecer?

“Não. Existe um avanço muito grande em termos de construção civil e a tecnologia tem uma demanda grande nesse processo, mas existe uma palavra muito usual que é ‘TRADIÇÃO’, e na América do Sul a mais requisitada é a construção em alvenaria (é um tipo de estrutura que utiliza pedras, tijolos ou blocos unidos por argamassa). Acredito que futuramente se substituam os materiais tradicionais, como é o caso da alvenaria, mas a sua essência deverá ser priorizada”.

Segundo Murilo, no Brasil há um forte incremento de financiamentos para a casa própria, e esses sistemas trazem ao público apenas materiais certificados para construção. “Grande parte das obras civis hoje são objetos de financiamento, ora por parte de empreendedores ou de quem vai comprar”

Prova disso é que a Caixa Econômica Federal (CEF) anunciou que deve lançar, ainda em 2021, um programa destinado a implantação de energia solar nas residências brasileiras. Segundo o presidente da Caixa, Pedro Guimarães, o Caixa Energia Renovável vai financiar a aquisição de placas solares com juros de 1,17% ao mês. O financiamento poderá ser contratado por meio do celular, pelo aplicativo Caixa Tem. Ele terá carência de seis meses e cinco anos para o pagamento.

O presidente da Caixa falou de outra iniciativa voltada à sustentabilidade: o Caixa Florestas. Por meio desse programa o banco pretende investir R$ 150 milhões para patrocinar a plantação de dez milhões de árvores em cinco anos. Segundo o presidente da Caixa foram selecionados quatro projetos. Serão quatro milhões de árvores, cinco mil nascentes e quatro milhões de pessoas sendo beneficiadas.


Qual é a casa dos sonhos atualmente? Pequenas ou grandes?

“Isso diz muito sobre o perfil do consumidor. Eu percebo que há uma tendência na diminuição do tamanho das construções e a otimização dos espaços. Acredito que as construções caminham para o meio termo, ou seja, nem pequenas, nem muito grandes. O tamanho de uma casa diz respeito ao custo; já as pequenas, em algumas situações, tendem a se tornar insalubres: a família vai aumentando e o espaço fica apertado, o que gera mais ruído, mais demanda e mais recursos. A tendência é diminuir a área construída das casas e otimizar o uso desses espaços, priorizando a relação humana com a casa dos sonhos. As casas grandes geram mais manutenção, mão de obra e o consumo energético, e ocasionalmente geram espaços que nem sempre acabam sendo utilizados com frequência? Metaforicamente eu cito uma lenda budista que diz que é necessário exercitar o Caminho do Meio”.


Valorização da natureza

Cresce a demanda pela arquitetura sustentável no Brasil. Murilo acredita que entre as tendências de decoração e de arquitetura que irão “bombar” nos próximos anos aparece a valorização da natureza. “Sem dúvida será a busca pelo verde, o contato com a natureza. A casa dos sonhos terá contato com a escolha de elementos naturais e a ocupação dos espaços de maneira despojada. O público já vem requisitando uma decoração que faça a conexão com a natureza, por meio de um paisagismo ou um jardim externo para criar essa atmosfera”.

Segundo Murilo, a inovação e a sustentabilidade irão caminhar com a arquitetura moderna. “Isso já vem acontecendo. Já temos uma gama de inovação e eu pesquiso muito sobre o assunto. Um arquiteto precisa criar soluções, não apenas funcionais, mas inovadoras. O próprio processo de criar já é uma inovação e junto com isso aparece a sustentabilidade que é um movimento que veio para ficar; é um caminho sem volta”, disse.

O arquiteto acredita que a moradia do futuro terá a identidade do seu morador. “As pessoas evoluem espiritualmente e a pandemia da Covid-19 trouxe essa lição para nós sobre acreditar que as pessoas vão olhar mais para si, aprender a se relacionar com os outros, porém de maneira diferente, com mais empatia. Haverá uma diminuição em se ostentar, mas sim em construir para os outros. A moradia do futuro vai ter a cara do seu dono. Ela vai ser absolutamente sustentável em todos os aspectos, desde o sistema interno até os jardins (com ervas medicinais, hortas, pomares), além de gastar pouca energia. Como elementos internos, a tendência é usar elementos naturais, como madeira certificada, objetos de artistas que provavelmente exaltem a questão ecológica nas suas obras. A tendência também é de o custo cair significativamente”.

O Brasil é o quarto país do mundo com maior número de processos de certificação LEED (Leadership in Energy and Environmental Design), reconhecimento concedido pela ONG Green Building Council.

Para receber o selo, segundo reportagem da Revista Exame, é necessário que as construções causem o mínimo impacto possível ao local onde serão erguidas e priorizem a criação de paisagismo com vegetação nativa; o uso de matéria-prima local; a reciclagem de restos de construções; a instalação de fontes de energia renováveis e sistemas hidráulicos voltados à economia de água; instalação de telhados verdes e jardins verticais; reutilização da água da chuva, entre vários outros itens. Por todas essas exigências, não é à toa que os benefícios ecológicos recebem os holofotes quando a sustentabilidade na arquitetura está em pauta.

Segundo o portal Research & Markets, o mercado global de edifícios verdes não residenciais deve crescer de US$69 bilhões em 2020 para US$ 79,47 bilhões em 2021, e a expectativa é que o mercado deverá atingir US$ 110 bilhões em 2025. Esses números são mais do que estimulantes, porém há mais. Até 2030, a previsão é que a construção de prédios sustentáveis gere mais de 6,5 milhões de postos de trabalho no mundo, segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT). Edificações sustentáveis têm maior valor no mercado imobiliário.

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