Padre Abel Zastawny se aposentará após cinco décadas dedicadas à diocese de União da Vitória
“O conhecido e estimado padre Abel Zastawny está completando 25 anos de sacerdócio, um fato realmente relevante e que merece ser registrado à posteridade pelo jornal O Comércio. (…) Inteligente, prestativo e dedicado, padre Abel é realmente um ser humano extraordinário e profundamente ligado à disseminação das verdades cristãs, defendidas ardorosamente pela Igreja Católica Apostólica Romana”. Foi com essas palavras que O Comércio celebrou em sua edição de 1º de julho de 1995 os 25 anos de sacerdócio do padre Abel. Agora, quase 30 anos depois, voltamos a prestar homenagens a esta figura tão querida do Vale do Iguaçu, mas desta vez em razão de sua aposentadoria, confirmada por Dom Walter Jorge no dia 07 deste mês.
Natural de Herval d’Oeste, padre Abel veio com a família para União da Vitória ainda criança, em 1952. E aqui ficou praticamente durante toda a vida, exceto pelo período que permaneceu em Ponta Grossa estudando ou participando da diocese daquela cidade, após sua ordenação. Também passou uma temporada na Itália realizando seu mestrado em Ciências Sociais.
O chamado para seguir o sacerdócio ministerial veio durante uma viagem. Padre Abel relata que a vocação sacerdotal não era um desejo que o acompanhava desde pequeno. Em um primeiro momento, a decisão gerou dúvida em sua família. Mas, com o passar do tempo, o fato se tornou motivo de alegria. “Foi uma coisa assim tão forte, um chamado de Deus, que não tive como duvidar. Aquilo foi uma luz, digamos assim, na consciência, dizendo: eu preciso de você. E tive que concordar. E acho que não foi um erro, nada, porque realmente me senti feliz nessa caminhada que realizei como padre. É o Deus que chama. É o Deus que tem os seus projetos e vai dando a conhecer para cada um. Não é só para o padre. Para cada pessoa que vai tendo o seu caminhar aqui neste mundo de uma forma bonita, coerente, alegre, uma perspectiva assim de muita realização pessoal”, recorda.
A ordenação sacerdotal de padre Abel aconteceu em 1970. Naquele tempo, União da Vitória fazia parte da diocese de Ponta Grossa. Em 1972, com a criação da diocese, o padre retornou para o Vale do Iguaçu. No início, trabalhou na então paróquia Sagrado Coração de Jesus, que posteriormente se tornaria uma catedral. Também permaneceu durante um período na paróquia de Fátima, até que em 2001 foi transferido para a recém construída paróquia de São Judas Tadeu, onde permanece até agora.
Durante sua jornada, foi professor do seminário. Na diocese foi, ainda, juiz auditor da Câmara Eclesiástica e chanceler da Diocese. “Fiquei trabalhando aqui o tempo todo. Foi uma caminhada gostosa, bonita, realizadora. Às vezes difícil, porque sempre as dificuldades vão aparecendo na caminhada das pessoas”.
Dentre os inúmeros momentos marcantes vividos, padre Abel destaca a participação na ordenação de Dom Walter, primeiro Bispo de União da Vitória, realizada no Estádio dos Ferroviários, bem como a ordenação de Dom João Bosco, em São Paulo, e Dom Walter Jorge, em Minas Gerais. “A vida da gente é marcante, nas coisas maiores, mais bem programadas, e nas coisas mais simples”.
Quanto aos momentos de dificuldade, o padre destaca que qualquer um está sujeito a períodos de contratempos mas que, no fim, o ânimo acaba prevalecendo. “O padre, como qualquer pessoa humana, pode estar sujeito e está sujeito a momentos, não de indecisão, mas momentos que passa uma pequena dúvida devido a uma situação quem sabe constrangedora. Um projeto que não foi suficientemente abraçado ou que não conseguiu os objetivos propostos. Aquilo pode deixar a gente um pouquinho para baixo. Isso é normal. Situações às vezes também de relacionamento, de familiar, de pessoas enfermas, doentes. Lutas. Tudo isso dá um momento pelo menos de, não é inquietação, mas uma certa amargura, passageira. Logo tudo isso é superado porque o que manda mais no nosso agir é a força da fé e a esperança. Essas horas de sombra, como a gente pode dizer, logo desaparecem porque o sol do nosso objetivo, da nossa vocação, da nossa caminhada, do projeto de vida que se assumiu, tudo isso volta a brilhar e nos encorajar novamente”.
Trabalho voltado aos jovens
Um dos grandes destaques na jornada sacerdotal de padre Abel foi seu comprometimento com os jovens. Durante seu período na diocese de União da Vitória, foi um dos responsáveis por implementar o grupo de jovens Treinamento de Liderança Cristã (TLC) ainda nos anos 70. Os encontros, inicialmente, aconteciam em colégios. Algum tempo depois, seguindo modelo adotado em Campinas, foi dado início ao encontro para adolescentes, denominado de mini-TLC. “Nesse mês de abril vamos realizar o encontro número 98. São 98 encontros, considerando uma média aproximada de 60 pessoas. Então estamos aí próximos de 6 mil jovens que participaram desses encontros”, destaca.
As crianças também não ficaram de fora da atenção. Para elas foi criado o encontro denominado Sementes da Alegria, em que os pequenos com idade entre 09 e 12 anos, segundo o padre, “vibram e brincam e aprendem e cantam e rezam e convivem, criam amizades”. Na paróquia São Judas Tadeu, há alguns anos, são realizados encontros da infância e adolescência missionários, para crianças de 10 a 12 anos. “Hoje, claro, tem essa dificuldade porque as crianças de idade escolar têm quase o tempo totalmente tomado. Os momentos de aula, depois outras atividades, mais isso, mais aquilo. Mas ainda algumas encontram tempo para vir aqui à noitinha para participar desses encontros. Tudo isso são coisas realizadoras, bonitas, a serviço do bem comum, a serviço da mensagem de Cristo, da pessoa de Cristo que quer estar no coração de todo mundo”, completa.
Para o padre, o incentivo aos grupos de jovens é importante para mostrar a eles a fé. “A gente apela exatamente para isso: venha fazer uma experiência religiosa mais intensa. E eles então se inscrevem e participam e saem vibrando, felizes, alegres, contentes. A gente vê a animação desses jovens quando participam. Eles têm direito de conhecer. É uma pena que existam tantas coisas, tantos chamados que eles têm, que às vezes não sobra tempo, até em família, para essa vivência, esse conhecimento, esse aprofundamento da dimensão espiritual de suas vidas. Então esses encontros são exatamente para, não para suprir, mas para ajudar as famílias a encaminhar os seus filhos para essa vivência pessoal, familiar e social no sentido religioso”.
Professor e jornalista
A presença de padre Abel não ficou presa a seu trabalho na diocese. Durante 22 anos, foi professor de filosofia na até então Faculdade Estadual de Filosofia, Ciências e Letras (Fafi) – hoje Universidade Estadual do Paraná (Unespar). Também lecionou, por um tempo, no Centro Universitário de União da Vitória (Uniuv). “Foi um tempo muito gostoso, muito bonito, aprendi muito. Professor não é aquele que só ensina, mas aquele que também se obriga a aprender para poder ensinar, e foi uma convivência muito gostosa que eu tive. (…) Essa caminhada no magistério, que me enriqueceu bastante no sentido humano, no sentido de amizades, cultural, e bonita convivência que a gente teve, principalmente com o corpo docente, e é claro também com os estudantes. Foi muito bom tudo isso para mim”, comenta.
Padre Abel também se formou em jornalismo pela Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Paraná, após sentir a necessidade de aprimorar sua capacidade de comunicação. “O padre deve ser aquele que tem o seu conteúdo, tem aqui a obrigação, o dever de comunicar para a comunidade religiosa a mensagem de Deus, a mensagem de Cristo, a Bíblia, e eu queria fazer isso de uma forma mais eficiente, mais produtiva, e por isso decidi também fazer o curso de comunicação social, ou jornalismo”.
Decisão pela aposentadoria
Padre Abel relata que segundo o Código de Direito Canônico, todo pároco, ao completar 75 anos, deve apresentar sua renúncia ao Bispo de sua diocese. Cumprindo a legislação, o padre apresentou sua renúncia oito anos atrás, mas acabou permanecendo na paróquia até este ano. Agora, perto de completar 81 anos, a saúde pede que padre Abel se afaste. A decisão, entretanto, foi tomada após um longo período de reflexão. “Há coisas que são, digamos assim, que vêm de improviso, e logo a gente encontra uma perspectiva de saída. Em outras situações você tem que trabalhar, tem que amadurecer, tem que refletir, tem que buscar auxílio, tem que dar tempo para que tudo amadureça também. Às vezes você olha assim uma fruta ali, aí está tão bonita, vai colher, vai experimentar, não estava no ponto ainda para ser recolhida. As situações da vida da gente, tem coisas que você tem que esperar que elas vão se acomodando, se ajustando e o tempo não deixa de ser um grande remédio para tudo também, dar tempo ao tempo. (…) Na quinta-feira que passou , a Diocese, através dos seus meios de comunicação, anunciou que o Bispo pretende fazer algumas mudanças, umas transferências de padres de uma paróquia para outra em vista das necessidades próprias da caminhada diocesana. E eu também, já pela idade, o Bispo concordou que eu tivesse, a partir de agora, um momento de cuidado maior com a saúde, aproveitar esses tempos que Deus me der ainda para viver de uma forma tranquila. Então, ele concordou com a minha aposentadoria”.
Agora, a ideia do padre é mudar para o litoral por recomendações médicas. “Já estamos preparando as coisas para essa mudança. É claro que os nossos laços de amizade, de bonitos relacionamentos aqui com União da Vitória e Porto União vão continuar. A gente não vai ficar desligado, distante. Só um pouquinho mais afastados, mas não uma distância que nos exclua uns dos outros”, afirma.
Após empenhar cinco décadas de sua vida à Diocese de União da Vitória, padre Abel avalia sua jornada e se diz realizado em sua missão. “A gente tem que ficar contente com aquilo que tem, com aquilo que precisa fazer, com aquilo que deve renunciar. A gente tem que ir aceitando. Eu acho que estar contente é você ter a consciência tranquila, dizendo: é isso que me é pedido para a vida, é isso que me é oferecido, é isso que eu devo realizar. Então a gente abraça com coragem, com ânimo, e tudo isso dá um contentamento, deixa a gente realizado”.
Tendo passado a maior parte de sua vida dedicada à fé, o padre fala que, em sua visão, uma vida sem fé é como um teatro, e que uma pessoa só fica completa se deixar sua dimensão espiritual ser tocada. “É um componente fundamental para você saber o sentido da vida, para enfrentar também com tranquilidade as reverses, os momentos difíceis. A fé dá um suporte muito importante, e sem a fé a pessoa diz: estou vivendo, estou aqui por quê? Qual é o sentido? Já estou trabalhando, já fiz tanta coisa, agora vou morrer. O que foi minha vida? Não foi nada. Não sobrou nada. E a fé vai dizer: sobrou sim. Tudo que você construiu interiormente, tudo isso vai subsistir, vai continuar, vai existir, porque você não vai desaparecer. Apenas o seu biológico que se desfaz, mas o seu eu interior, demos o nome até de alma ou espírito, isso sobrevive, isso vai ter existência para sempre, então a fé é muito importante nesse sentido”.
Durante a entrevista para O Comércio, o padre aproveitou a oportunidade para deixar um recado para a comunidade. “Vocês me fizeram feliz. Vocês me deram a oportunidade de poder me realizar na minha caminhada. As amizades que vocês ofereceram, a convivência bonita que a gente teve, os exemplos, os estímulos, as luzes que vocês foram para que eu pudesse sempre procurar encontrar a melhor maneira de fazer minhas atividades, meu trabalho. Eu tenho que agradecer muito e levo todos no coração, com muita alegria. Para mim, tristeza porque vou morar fora não é tristeza, é necessidade quase, por questão de saúde. E a todos que ficam, meu agradecimento, meu abraço fraterno. Não sei até quando vou ficar aqui, até que dia, mas quando pegar minhas coisas e me retirar, eu vou deixar assim um abraço muito apertado, muito agradecido para todos, para todos mesmo”.
A celebração da última missa pelo padre Abel ainda não está marcada. A expectativa é que ele permaneça na paróquia São Judas Tadeu, pelo menos, até o final do mês.
Voltar para matérias