Morro do Cristo abriga maior escadaria em mosaico do Brasil
O Morro do Cristo, ponto turístico mais conhecido de União da Vitória, ganhou um novo atrativo: a maior escadaria em mosaico do Brasil. São 20 painéis, divididos em 224 degraus, contando a história da cidade e do Vale do Iguaçu. A inauguração da tão esperada revitalização aconteceu no domingo, 30.
A ordem de serviço para início das obras foi assinada em julho do ano passado. Mas o processo de criação das imagens que fariam parte do mosaico começou ainda em 2022. Carlos Kussik, artista plástico responsável pelas pinturas que serviram como base para o trabalho da mosaicista Ragli Vanessa Rotta Martins, relata que, entre pesquisas sobre a história de União da Vitória e a confecção das artes, despendeu cerca de 60 dias na obra. “Esse processo de fazer uma obra com um teor mais histórico envolve uma série de pesquisas. Então você tem que pesquisar a história da região. (…) Sendo de União da Vitória, eu gosto muito da história local, da canoagem, do tropeirismo e assim sucessivamente. Como eu gosto muito disso e eu já tenho conteúdo para isso, eu fiz os estudos dentro desse conhecimento”, explica.
Após apresentado um esboço das artes, os desenhos foram finalizados e, já nas mãos de Ragli, passaram por um processo de ampliação digital para que pudessem ser replicados nas telas que compõem o mosaico, cada uma com cerca de 16 cm de altura por 2,3m de largura.
O artista plástico também realizou a restauração e revitalização das capelinhas que ficam ao lado da escadaria contando a história da Via Sacra. Agora, avaliando seus trabalhos no Morro do Cristo, Carlos se diz contente com o que entregou. “É um conjunto de trabalhos artísticos que eu acho que ficou bem bonito. E eu me sinto bem satisfeito, até realizado com a finalização do trabalho e também descansado, porque agora eu vi que está pronto, fico muito feliz com o resultado final. (…) Estou satisfeito. Muito satisfeito, porque a Ragli e a equipe dela fizeram o meu trabalho exatamente como era o desenho. Acho que é um trabalho bem bonito, espero que o resultado agrade as pessoas”.
História transformada em arte
Cada um dos 20 lances que compõem a escadaria são um painel da arte, mostrando uma espécie de linha do tempo da história de União da Vitória. O primeiro deles apresenta um coração envolvido pelo principal elemento da arte e presente em todos os painéis: o rio Iguaçu.
Na sequência são apresentados elementos da fauna e da flora da cidade, além de povos que habitavam a região. Após, é destacado o desenvolvimento da cidade por meio do comércio no Iguaçu, a exploração da erva-mate, a passagem dos tropeiros pelo vau, a colonização europeia e a agricultura da região.
Nos painéis também são retratadas algumas figuras históricas, como o coronel Amazonas de Araújo Marcondes, e personagens simbólicos da Guerra do Contestado, entre eles o monge João Maria, Frei Rogério, coronel João Gualberto, Percival Farquhar, capitão Ricardo Kirk e a líder sertaneja Maria Rosa.
Após três painéis dedicados à Guerra do Contestado, as artes passam a contar a implementação da indústria madeireira, além de serviços que começaram a ser ofertados em União da Vitória, como hospitais, bancos e escolas.
Há, ainda, um painel dedicado à qualidade de vida, mostrando o esporte, o turismo e o lazer. Arquitetura e pontos turísticos do município também receberam seu próprio painel.
No penúltimo lance, destaca-se a liberdade religiosa, representada por símbolos de diversas crenças e religiões. Por fim, um coração agregando representações de todas as etnias que formaram União da Vitória.
Trabalho em mosaico
A mosaicista Ragli relata que a escolha do mosaico, uma das formas de artes mais antigas do mundo, para retratar a história do município se deu em razão de sua durabilidade. O processo de confecção dos painéis durou um ano e quatro meses, e envolveu uma equipe formada por dez pessoas, sendo elas Clio M. Bojaraki Wiese, Dani Souza, Edson Renato Pippi, Gi Zanluca, Jussara Faria, Jussara Wolhmuth, Juraci Volpato, Rita de Cássia L. D. Nemes e Tayla Furukawa Niyme, além da própria Ragli.
O mosaico foi confeccionado em cerâmica, material mais resistente que um azulejo. Para a montagem das artes, as peças eram quebradas com um torquês, resultando partes menores que eram, então, montadas em uma espécie de quebra-cabeça sobre a tela, em uma técnica chamada de trincaniz. “São pedacinhos pequenos que a gente vai encaixando um no outro conforme a cor que está no desenho para que a gente vá preenchendo esse desenho com essas tecelas de cerâmica”, explica Ragli.
Os mosaicos foram feitos sobre uma tela de fibra. Após um degrau estar pronto, a tela era cortada em três partes para garantir que pudesse ser transportada de Balneário Camboriú, cidade onde fica o ateliê de Ragli, até União da Vitória. Aqui, as telas foram remontadas e instaladas na escadaria. “Toda a minha equipe veio pra cá ajudar a instalar. Nós tivemos um pedreiro, Daniel, que foi essencial pra gente também. Caprichoso, e nos ajudou muito. Levamos um mês praticamente pra instalar. Todos os dias, desde bem cedinho até quase anoitecer, a gente ficava lá pra instalar, porque é um processo demorado, delicado, então foi bem demoradinho. (…) Foi um mês bem intenso, mas foi sensacional, foi divino, foi uma bênção. Eu digo que foi uma bênção esse pedido, esse trabalho que a gente até às vezes precisa se beliscar e olhar e dizer: olha, foi a gente que fez”, relata Ragli.
Esse foi o maior trabalho da carreira da mosaicista em termos de metros quadrados. Para realizar uma arte tão meticulosa, todos os artistas envolvidos trabalharam quase que diariamente durante os 16 meses de confecção do mosaico. A curiosidade e expectativa de ver o trabalho finalizado foi um dos incentivos do grupo. “Eu não mostrava muitos desenhos para eles. Eles sabiam o total como era, mas a gente não estava o tempo todo vendo. Eles sempre queriam saber [a arte seguinte] e isso nos dava uma motivação tremenda para ir terminando um e começando outro. (…) Na montagem aqui, cada degrau e cada painel que a gente terminava, a gente olhava debaixo e não teve um dia sequer que alguém não se emocionou. E daí um chorava de emoção e levava todo mundo ao choro também, de satisfação e de alegria de ver o quão bonito ficou. É muito gratificante. (…) Toda a equipe, tivemos a sensação de dever cumprido, de que tudo ficou da maneira como a gente queria que ficasse. Fazer um mosaico, ver ele todos os dias e terminar o painel, embalar, trazer, todo o processo que a gente passou, não é a mesma coisa do que você olhar e ver ele inteiro, pronto, acabado, e que tudo se encaixou, e que tudo ficou perfeito. Todo mundo olhava e dizia: ah, esse aqui fui eu que fiz, essa peça fui eu que coloquei. Era muito gratificante ver todos os dias o pessoal animado, motivado para instalar”.
Segundo o prefeito de União da Vitória, Bachir Abbas, a escadaria em mosaico faz parte da primeira fase do processo de revitalização do Morro do Cristo, que conta também com a construção de um mirante e revitalização da estátua. A segunda etapa prevê a entrega do restaurante café e de um funicular, para permitir acessibilidade a idosos e deficientes que não possuam condições de subir a escadaria. A expectativa é de que, com as obras, o número anual de visitantes no ponto turístico passe de 40 mil para 100 mil.
Voltar para matérias