Opinião: A boia ao centro

Quem de vocês se lembra de alguém que já venceu eleições presidenciais no Brasil com postura de centro? Respostas positivas só podem vir de cabeças grisalhas, com ótima memória ou dispostas a algumas concessões ideológicas.
Quer dizer que o centro nunca elegeu presidente no Brasil pós redemocratização? Venceu todas, mas, para isto, nem precisou ter o candidato mais votado por uma razão muito simples: depois do bipartidarismo, e seus instrumentos de fidelidade partidária, a legislação foi liberalizada e permitiu dezenas de siglas, resultando no monstrengo que batizamos de presidência de coalizão, que exigiu a construção negociada da governabilidade.

Encerradas as eleições municipais de 2024, esta leitura ganha ainda mais força. A direita, na oposição, cresceu e a esquerda, mesmo no governo, ficou quase do mesmo tamanho e, as siglas mais próximas do centro tiveram um excelente desempenho e isto poderia resultar em uma candidatura competitiva ao centro, porém, com vasta experiência, já aprenderam que podem sobreviver ao primeiro turno, fazer suas apostas no segundo e, se errar, esperar o momento certo para apresentar a fatura da governabilidade.

Na direita, revigorada pelas urnas, se percebe que o inchaço quebrou a unidade, o líder natural está fora do jogo, mas persiste acreditando que seu umbigo é o único conselheiro razoável, distribuindo cotoveladas nos companheiros, sempre visando preservar seu espaço, como se o vácuo já não tivesse sido determinado pela inelegibilidade. Novos nomes, como Ratinho e Caiado, saem cacifados das urnas e outsiders como Marçal se sentem encorajados porque São Paulo e Curitiba apontam para um atalho para construir candidaturas viáveis, todavia, a conclusão soa óbvia: Tarcísio de Freitas surge como solução natural no campo da direita, inclusive por ter um perfil muito próximo de candidato de centro, facilitando a convergência política e eleitoral.

E o que resta ao governo? Sem dúvidas, jogar uma boia ao centro.

Ainda que não seja uma tragédia, já que o PT nunca brilhou nas municipais, o recado das urnas precisa ser entendido e transformado em ações que revigorem a força do governo e, neste sentido, uma profunda correção dos rumos da comunicação, das prioridades de Lula e sua pauta internacional, seguidas de uma reforma ministerial que consolide o projeto de uma frente ampla com Lula capitaneando a chapa nacional e, provavelmente, o PT como satélite em muito mais estados do que desejaria, como revisão da composição de forças do governo, redivisão de espaços, para que o governo tenha peso para fisgar algumas siglas para sua frente de 2026. Com partidos de esquerda certos, o PSB valorizado, mas próximo, a aposta se concentra nas siglas maiores do centro, PSD e MDB em especial, além de torcer para que a direita siga dividida.

Observem que Kassab, do PSD, virtual primeiro-ministro de Tarcísio, é figura central para arrumar o tabuleiro, retendo o governador Tarcísio em São Paulo, assim como Lula fará com Alckmin e Haddad, abrindo caminho para confronto com nomes menos expressivos eleitoralmente. Sem esse arranjo, a polarização é inevitável, com a direita unida em torno de um nome favorito, porque tem uma rejeição muito menor.

Logo, o experiente Lula sabe que precisa jogar a boia ao centro, como fórmula única para construir o cenário ideal para si: Tarcísio em São Paulo e PL e União com nomes diferentes na disputa presidencial.
Sem isso, a Esplanada estará enfeitada em amarelo na virada do ano de 2026.

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