Opinião: Lula enfraquecido aumenta risco institucional
Mesmo fechando este texto antes das urnas do segundo turno, a foto das eleições mostra Lula e o PT como principais decepções do pleito municipal. Nem é o caso apenas de comparar com números de 2020, que apontam para um resultado alinhado, a questão é que, agora, o PT é governo e deveria colher mais frutos do exercício do poder.
Sem nenhuma vitória expressiva, assistindo disputas finais com dois adversários da direita em várias cidades, alijado das disputas até em redutos tradicionais, como o ABC paulista e algumas capitais do nordeste, quadro que se agrava quando comparado aos bons resultados do centro e ao crescimento inquestionável da direita, o governo precisa repensar, no curto prazo, suas estratégias para tentar chegar competitivo em 2026.
Alguns diagnósticos, repetidas vezes antecipados por diversos analistas, estão fechados: a comunicação do governo precisa de urgente correção de rumo e a agenda de Lula e principalmente sua pauta prioritária cobra uma revisão urgente. Venezuela, Argentina, Ucrânia, Rússia, Israel e Palestina, arrancaram declarações excessivas do presidente, boa parte delas desastrosas, em intenso conflito com o senso comum da população.
O Lula das ruas que gostava do povo ficou no passado, o que se vê agora é um presidente acuado, decepcionado com a receptividade que persiste com Bolsonaro e lhe é negada em quase todo o país. Com exceção da campanha paulistana, onde apesar de tímida, teve sua participação, Lula não bateu ponto no ABC ou no Nordeste, assustado com a rejeição que nem mesmo os bons números da economia conseguem reduzir.
Como em um campeonato eleitoral, Lula sabe que só pode vencer por “pontos perdidos”, a famosa rejeição menor, porque restam poucas dúvidas que a primeira vaga para o segundo turno em 2026 será da direita, com muita gente do governo enxergando o mesmo horizonte que vislumbro: com Tarcísio candidato único da direita, talvez nem tenha segundo turno.
Exatamente este raciocínio que aponta para o inacreditável. Talvez seja melhor Lula torcer, e até se movimentar, para liberar Bolsonaro que, como ele, tem muitos votos e rejeição ainda maior. Seria uma eleição muito mais adequada para Lula porque, sem Bolsonaro, apenas a divisão da direita, com alguém como Marçal dividindo o pacote da direita, alivia a situação do PT.
Em termos estratégicos, Lula deve se mover para a centro esquerda, minimizando os atritos e possibilitando a etapa mais importante da caminhada: a cooptação do centro, em especial a parte “pragmática” do centrão, aquela que ganha sempre, antes ou depois das urnas. Se o governo sabe disto, os profissionais da política de centro trabalham esta possibilidade a tempos, sendo razoável supor que um confronto institucional com o STF esteja no horizonte das possibilidades.
Objetivamente, sabemos que Bolsonaro será sempre derrotado no STF, 9 a 2 ou algo parecido em qualquer questão, por tudo que houve de animosidade entre as partes, restando ao Congresso combater o Supremo para recriar condições para uma anistia ampla aos golpistas de 8 de janeiro que se estenda ao ex-presidente e, talvez, algumas lições do box sejam adequadas por ensinar oponente mais fraco a jabear e recuar repetidas vezes, minando resistências e criando um quadro favorável a seus propósitos.
Sem nenhuma solução legislativa ao alcance, a hostilidade ao Supremo está sendo gradualmente desenhada, cada vez com tintas mais fortes, e, com um governo enfraquecido, sem alternativas eleitorais fora do centro, a equação pode apontar para algo imprevisível no passado recente: Lula assistir impassível ao processo de confronto que pretende achar qualquer atalho que libere Bolsonaro para a disputa eleitoral.
Boulos poderia ter resolvido o problema vencendo em São Paulo que teria o efeito de limitar o voo de Tarcísio o alijando do pleito nacional, sem isto a situação é complexa para Lula, alternativa única da esquerda até que o processo de bidenização seja irreversível, porque o presidente não dá espaço para ninguém que não se chame Janja, restando, dessa forma, a hipótese maior de torcer para que o time adversário não entre em campo com os titulares.
Se Tarcísio seguir hesitante, com Bolsonaro inelegível, restam poucas alternativas eleitoralmente consistentes, ainda que Ratinho e Caiado, reforçados por Eduardo ou Michele de vice, possam ser competitivos, esta hipótese é quase um convite para nova aventura de Pablo Marçal, aquele que mesmo perdendo eleições, sempre vencerá nos negócios digitais.
Espere por um governo mais agressivo, muito mais crédito, melhoria na comunicação e com Lula entendendo que não tem eleição para presidente da ONU, mas, ainda assim, suas melhores expectativas para 2026 continuam sendo apostar nos erros e na divisão da direita e para que a polarização obtusa continue impedindo o eleitorado de analisar qualquer nome que não esteja com pedras na mão apontadas para o lado oposto.
Nada muito promissor para quem esperava um avanço na qualidade do debate e da ética na disputa presidencial e percebe que a melhor consequência das urnas municipais é recolocar o Brasil como prioridade na pauta das preocupações do nosso presidente.
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