Opinião: Qual é a tua, Lula?

Todo e qualquer cidadão tem, para além do arbítrio pessoal, inúmeras maneiras de policiar suas atitudes e tentar se ajustar ao senso comum, estabelecido pelos valores aceitos pela sociedade. Ultrapassar estes limites, garante adjetivações, desde estranho, esdrúxulo até ridículo, quase nunca agradáveis. Todavia, a observação contínua do padrão social, sempre em evolução, conta sempre com a ajuda imprescindível dos amigos, aqueles que não hesitam em nos aconselhar e até puxar nossas orelhas quando saímos do prumo. Lula está sem amigos?

Muito mais que o politicamente correto que exigiu que corrigíssemos nossa linguagem coloquial, em especial aos carinhosos apelidos que carimbavam toda a turma na infância, com muito mais ingenuidade que maldade, e, principalmente, nos ensinou ao correto procedimento de respeito e atenção às minorias de todas as ordens.
Afirmo com segurança que a sociedade contemporânea está muito mais focada em atender aos padrões convencionais da atualidade, confrontá-los nos leva ao desprestígio social, por isso, com a vigilância das redes sociais, o grande irmão de Orwell do século XXI, somos continuamente controlados pelo senso coletivo e, cada vez com mais intensidade, condenados quando exercemos leituras fora dos padrões.

Será ainda por muito tempo, uma transição lenta e gradual, mas estamos em direção de uma sociedade plural, ética e alinhada com valores que eram ignorados pelas gerações anteriores. O padrão “politicamente correto” cada vez mais se impõe com a mesma naturalidade que vamos absorvendo conceitos como sustentabilidade, por exemplo, que passam a ditar nossas ações, reações e até padrão de consumo. Quem quiser, que use do livre arbítrio para manter seus costumes, ainda que medievais, mas saiba que a condenação social tácita lhe garantirá uma desconfiança como se estivesse com uma tatuagem na testa.

Exceto se determinada por fatores fora do controle pessoal, será que as pessoas não percebem que agridem o senso comum e a opinião pública ao se manifestarem na contramão da leitura consensual da sociedade? Nosso presidente, talvez repetindo o efeito “Biden”, ignora solenemente a opinião da sociedade, se considera acima do julgamento comum ou se isolou na bolha do poder, cercado de áulicos que aplaudem até suas flatulências, infelizmente sem ninguém que o confronte com a realidade cruel, muito além dos delírios estabelecidos pela inexplicável solidariedade aos parceiros do Foro de São Paulo. Sai da bolha, Lula!

Como eu, milhões de brasileiros já foram abordados por venezuelanos nas esquinas e semáforos das nossas cidades, pedindo socorro para recomeçar, para fugir do pesadelo que se iniciou com Chaves e segue com Maduro, contando com detalhes sórdidos a crueldade do governo venezuelano que Lula insiste em afrontar a inteligência do povo ao se negar a usar os adjetivos corretos para qualificar o genocídio, o narcotráfico e os abusos da ditadura venezuelana. Lula, falo por mim, mas talvez outros brasileiros acompanhem meu repúdio, me respeite, não sou burro e nem cego!
Nem ousem me cancelar ou me desqualificar para minimizar minhas críticas porque as faço, com revolta, mas com responsabilidade. Não sou bolsominion, nem vou julgar quem o seja, nenhuma rejeição significativa ao PT, nem radical de direita ou esquerda, mas apenas um brasileiro que gosta de ler, se informar, tem acesso aos noticiários, imprensa e redes sociais e com um mínimo de cultura para diferenciar liberdade e democracia de perseguição e ditadura e que já se sentiu ofendido quando Brasília estendeu tapete vermelho para o ditador venezuelano. Mantive o silêncio porque entendo que os interesses comerciais e a diplomacia nos ensinam que países não tem amigos, mas parceiros de negócio.

Até a China, proscrita do Itamaraty até meio século atrás, hoje nosso principal cliente, comprova que comodities, serviços e bens precisam circular e podem ser trocadas sem resquícios do regime que a produziu, ainda que a sociedade moderna comece a pensar em posturas mais agressivas contra o trabalho infantil, escravo ou com déficit de liberdade. Razões pragmáticas nos levam a manter o respeito pela soberania externa, mas jamais admitir parcerias e compadrio que signifique aceitar as atrocidades que sejam cometidas contra qualquer ser humano de qualquer nacionalidade.

Como mais um dos milhões de brasileiros que colocou um tijolinho na construção da nossa democracia, construída pela solidariedade às vítimas dos porões da ditadura e combate ao arbítrio, a grande maioria hoje abrigada na sigla petista, me envergonho de ouvir acenos de solidariedade ao cidadão que representa todo conjunto de ações sórdidas de massacre da população, de imposição da força, da fome, da privação da liberdade e remete a tudo que combatemos por quase três décadas para que nossas fronteiras não fossem porta aberta da liberdade que imploramos.

Como milhões de idealistas, ando pelas ruas com orgulho da democracia que estamos construindo, mas preservo a memória das trincheiras que foram necessárias para angariar forças no combate à ditadura, para vencer a censura, para garantir a liberdade de expressão que me permite soltar a indignação contra um presidente que quer trabalhar como ilusionista, enxergando não apenas o mundo de Nárnia, por certo envergonhando Clive Lewis que a concebeu como uma dimensão que nos remete ao paraíso e não ao terror venezuelano.

Presidente Lula, reveja com urgência seus conceitos para não se distanciar ainda mais da sociedade brasileira, sei que na média temos pouca leitura e cultura, mas até os mais humildes conseguem entender pelos vídeos que retratam o sofrimento de um povo que você, por irresponsável solidariedade ideológica insiste em negar e o faz na condição de chefe de estado o que torna a atitude ainda mais deplorável.

O Brasil torce para que dentre os milhares de assessores, pelo menos um tenha altivez e diga ao presidente que a população se envergonha de suas declarações, as repudia e pede que não as repita. Não merecemos passar esta vergonha.

Talvez nos faltem marias corinas, como a valente líder que desconhece o medo, que não se entrega, que luta por tudo que acredita, que não arreda um milímetro na defesa de seu povo e segue de cabeça erguida, enfrentando o arbítrio e esperando que a parte civilizada da humanidade lhe seja solidária e não permita um genocídio seletivo, sob a tutela do narcotráfico com chancela oficial.

Acorda Lula, ouça a lamúria dos irmãos venezuelanos repetindo Vandré…
Pelos campos, há fome, em grandes plantações.
Pelas ruas, marchando indecisos cordões.
Ainda fazem da flor, seu mais forte refrão
E acreditam nas flores vencendo os canhões.
Sim, os canhões de Maduro.

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