Opinião: “Reforma política, o atalho para o primeiro mundo”
Permito-me divagar sobre algumas questões que traduzem a tragédia política nacional, onde a ideologia e ética foram substituídos, sem cerimônia, pelo resultado de curto prazo e que, em conjunto, constrangem o brasileiro comum, descomprometido das falcatruas que perpetuam o poder.
Por conta disto, a alma brasileira segue constrangida por uma série de fatores que se somam: a tensão política permanente no ar, a leitura sobre o STF e seu excesso de presença e ativismo, a visão do Congresso comprometida pela noção simplista de que tudo é negócio e que as votações só se definem com verbas.
Lendo um artigo do ex-ministro Nelson Jobim, percebi que sua leitura é muito sensata e busca vincular estas questões em um único diagnóstico; a supremacia do individual que torna parlamentares e ministros mais importantes que partidos e STF, respectivamente. Como correlato, é lícito implicar o Executivo neste mesmo enredo que engloba os demais poderes.
Ainda que uma consulta ao TSE demonstre que os partidos são os grandes financiadores das campanhas vitoriosas, cada vez mais assistimos na rotina parlamentar o jogo do salve-se quem puder. Anos luz das tratativas em que líderes de bancada ajustavam posições que obtinham um elevado grau de adesão, agora ninguém quer dividir o espólio partidário, sabendo que basta manter um padrão razoável de insubordinação para conseguir lugar à mesa de negociação. Os ganhos individuais, garantidos pela penúria do governo, sempre desesperado para atingir o quórum da governabilidade, superam com folga as migalhas do banquete partidário, sempre generoso com a cúpula e econômico com o segundo escalão e o baixo clero.
Se já era difícil construir maioria, um longo caminho entre a centena oriunda das urnas e o número mágico que consagra as pautas do governo, com 35 partidos, agora a tarefa é hercúlea por exigir que algumas dezenas de parlamentares necessitem de indulgências pessoais ou regionais para assumirem pautas nem sempre simpáticas ao eleitor porque governo sempre luta por recursos e adora mexer no bolso do cidadão. Mas a tragédia política moderna não se encerra neste capítulo.
Na prática, exceto pelo período eleitoral onde o presidente da sigla carrega a chave do cofre do fundão pendurada no pescoço, não há nenhuma autoridade partidária sobre o deputado e isto consagra a negociação individual, agravada pela falta de sintonia do governo atual, onde, até que o chefe bata na mesa, cada liderança aponta um caminho e nem todos levam à Roma.
Não há sintonia na ação governamental, se torna comum, no mesmo debate, ministros divergirem porque não se constrói unidade interna pela simples razão que o governo, assim como a anterior, chegou ao poder sem projeto, planos ou rumo bem definido, vagamente apontando para linhas gerais como prioridade social ou estado protetor, definições que permitem abarcar milhares de teses desconexas. Nem mesmo alguém com ascendência sobre o patrão, para minimizar excessos verbais ou ações incoerentes até com os planos internos. Vira o sétimo céu para os oportunistas.
O segundo ato desta tragédia versa sobre a incapacidade da classe política de administrar conflitos, por falta de intermediários com autoridade para assumir acordos, transferidos para a esfera individual, e, como consequência, a judicialização dos conflitos se tornou regra, transformando o Supremo em órgão legislativo auxiliar, ou, como alguns já declaram, o Congresso é que acaba virando apêndice.
Lógico que toda esta questão, como uma equação complexa, pode ter muitas respostas, mas, com tantas variáveis em aberto, pode ser também uma equação sem solução.
Saindo da matemática, em retorno ao mundo político, parece evidente que uma reforma política é inadiável para estabelecer novas condições para o equilíbrio entre os poderes, definir claramente os limites e responsabilidades e permitir segurança institucional, inclusive como elemento necessário para alavancar investimentos e a própria economia.
Objetivamente, quem está em campo, participando do jogo e dividindo o “bicho”, nas vitórias e até nas derrotas, não quer mudança, todavia quem está na arquibancada, pagando ingresso, salário e mordomias dos atletas precisa exigir que as regras sejam corrigidas.
O jogo, muito mais que uma disputa de rivais em campos ideológicos opostos, decide a velocidade de transformação do nosso país e a possibilidade de subirmos de divisão.
O Brasil precisa sair da terceira divisão mundial, mas sem ajustes internos será sempre um caminho tortuoso. Corrigir nosso conjunto de regras pode ser o pavimento que nos permita ter velocidade na necessária transição do país para o primeiro mundo.
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