Opinião: “Trampolim ou picadeiro do Marçal?”
Para os que não me conhecem, informo que sou diretor de uma emissora FM e, embora paranaense, penso seriamente em promover um debate sobre as eleições paulistanas. Nem sei se aceitarão meu convite, mas já tenho a letra da vinheta de chamada…
Chegou, chegou, tá na hora da alegria
Chegou, chegou, tá na hora da alegria
O circo tem palhaço, tem, tem todo dia
O circo tem palhaço, tem, tem todo dia
Sim! Nem parece política, a eleição paulistana virou picadeiro de circo (ou seria caso de polícia?).
Quem conhece nossa história política, sabe das inúmeras vezes que o eleitor zombou das urnas, sendo o rinoceronte Cacareco, recordista de votos para vereador, a mais notória brincadeira eleitoral. Muitas vezes, o nível do debate esteve na linha da mediocridade, em várias eleições, por alguns momentos, todavia, a eleição paulistana, com todo o respeito aos candidatos que querem falar sobre planos, perdeu a noção do ridículo. Agora são os candidatos, um em especial, quem zomba do eleitor.
As provocações, as intenções secundárias, a esculhambação promovida pelo candidato Pablo Marçal é um atentado contra a civilidade, ainda que seja ele a vítima do enfurecido Datena, no último domingo, 15, no debate da TV Cultura. Todavia, o conjunto da “obra”, neste período eleitoral, transcende qualquer decência.
Objetivamente, é bom frisar com todas as letras, alguns veículos buscam mais audiência, garantida com o picadeiro armado pelo candidato, do que prestação de serviço à população. Um mínimo de respeito com a opinião pública, indicaria a supressão do candidato dos debates, amparado pela legislação que, por não ter representação congressual, não deve, obrigatoriamente ter vaga neste tipo de evento.
Retirar Marçal dos debates, que ele com inteligência transformou em palco para construção de seus “cortes”, estratégia válida, mas que, talvez deliberadamente, virou um circo, onde o candidato tenta compensar a sua ausência do palanque eletrônico, é uma questão de respeito com o eleitor. Nossa democracia não merece tal desmoralização, por mais que muitos outros fatos convirjam nesta direção.
O retrato da eleição paulistana, projetada para ser a preliminar de 2026, confrontando, no principal colégio eleitoral, uma disputa aberta entre os dois polos nacionais, Lula contra a dupla Bolsonaro e Tarcísio, representados por Guilherme Boulos e Ricardo Nunes, esplendidamente secundados pelas excelentes Marina Helena e Tabata Amaral, tinha todos os ingredientes para ser uma nova página da nossa política recente, com candidatos menos propensos ao confronto que seus correspondentes federais, focados em discutir cada uma das pautas, segundo a ótica ideológica e pessoal de cada candidato. Pessoalmente, estava animado com o confronto que deveria ser exemplar.
Então, apareceu Marçal e tudo virou uma palhaçada. Importante registrar que o candidato tem muitas qualidades, excelente poder de comunicação, inteligência acima da média e raciocínio super-rápido, mas definiu uma estratégia que conjuga objetivos e financeiros e persegue suas metas, sem nenhum pudor ou respeito à ética.
Seu poder nas redes sociais já somava mais de vinte cinco milhões de seguidores, e com este patrimônio imaterial já era o brasileiro que mais faturava nas redes e, impulsionado pela visibilidade eleitoral é lícito projetar um novo patamar, talvez cinquenta milhões de seguidores, multiplicando seus resultados financeiros. Um ótimo negócio que pode até ter bônus político.
Nada que a direita faça, nenhuma concessão para Bolsonaro ou Tarcísio, se não for impedido, Marçal disputará a presidência em 2026 simplesmente porque vai fazer muito bem para os seus negócios. Ele não tem grupo político, mas parceiros de negócio e funcionários. Não precisa de alianças, apenas de uma legenda e como um circo nômade, ele vai estrear em outra praça.
Lógico que nossa democracia está em risco, viramos chacota internacional com o vale tudo dos debates. Ladrão de banco, rei das licitações ou cheirador de cocaína são codinomes dos candidatos impostos pelos adversários, envergonhando seus eleitores e os cidadãos que ainda clamam por decência na política.
Importante observar um deslocamento do centro de gravidade das eleições que já não gira apenas em torno do palanque eletrônico, das rádios e tvs, mas precisa incluir a internet, literalmente terra de ninguém, onde o lado B, algo como a deep política, aumenta geometricamente sua influência eleitoral, onde fakes superam cidadãos comuns, distantes dos recursos, disponibilizados pelas campanhas e pelos partidos, para a campanha de desconstrução, extremamente mais relevantes que o processo de marketing e construção de imagem tradicional nas campanhas anteriores.
2022 ensinou que é a rejeição o fator mais relevante das eleições, porque em qualquer segundo turno é este fator que define o vencedor. O quadro é tão ruim que votar no “menos ruim” se tornou a opção mais sensata.
Continuarei pesquisando, contando com a ajuda dos senhores, porque me sinto incapaz de propor qualquer alternativa que nos proteja do lixo eleitoral, do chorume que exala dos debates, apenas acho que, se quero circo, melhor procurar pelo Patati e o Patatá do que me submeter ao circo de horrores de Marçal.
Nossa democracia é incipiente, tem limitações, mas nem assim merece que a cena política vire palco de comédia. Reprovo Datena, mas registro que milhares de brasileiros tiveram vontade de dar uma cadeirada na televisão. Imagino este maluco como presidente, ditando regras no curralzinho do Alvorada.
Deus tenha piedade do Brasil.
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