Prescrever medicação sem avaliar previamente o quadro clínico e o histórico do paciente pode levar à morte. Quem faz isso está sujeito a arcar com as consequências previstas na lei. Em Capinzal, um médico acaba de ser condenado pelo Tribunal do Júri, a pedido do Ministério Público de Santa Catarina (MPSC), por homicídio doloso durante o plantão.
Os jurados reconheceram que André Luis Correa Reinhardt assumiu o risco de matar um paciente pulmonar de 70 anos ao sedá-lo com Diazepam, medicamento que exige cuidados extremos quando aplicado em idosos ou em quem sofre de insuficiência respiratória, podendo causar apneia e parada cardíaca. A acusação foi conduzida pela Promotora de Justiça Raquel Marramon da Silveira e a pena foi fixada em oito anos e dois meses de reclusão em regime inicial fechado.
“O réu apresentou atitudes totalmente inadequadas para o exercício da medicina, tendo demonstrado completo desprezo pela vida humana. O paciente chegou lúcido ao hospital, apresentando um quadro clinicamente favorável, mas o médico conduziu o caso de forma a assumir o risco de provocar sua morte”, diz a Promotora de Justiça.
O fato aconteceu em 7 de janeiro de 2011 em Capinzal. Segundo consta nos autos, naquela manhã, um senhor de 70 anos sofreu uma queda doméstica e foi até o Hospital Nossa Senhora das Dores para receber atendimento. Ele fez um exame de raio-X, foi medicado e permaneceu em observação.
No início da tarde, o réu assumiu o plantão e resolveu submetê-lo a uma pequena cirurgia no pé. Segundo a denúncia, ele determinou o uso de Diazepam para a sedação, “sem realizar o exame físico detalhado e sem exigir exames laboratoriais, funcionais, por imagem ou documentos de outros atendimentos que poderiam fornecer informações técnicas a respeito de doenças preexistentes”.
Momentos depois, o médico foi avisado pela equipe de enfermagem que os batimentos cardíacos estavam caindo e ordenou, de forma indevida, que uma nova dose de Diazepam fosse aplicada. A situação piorou e ele não tratou adequadamente as complicações que se sucederam, abrindo mão de procedimentos preconizados para a recuperação do paciente, afastando-se diversas vezes da sala de atendimento e deixando a equipe sem orientações.
Como se não bastasse, ele passou a xingar os funcionários do hospital e a chutar os móveis dentro da sala. Tudo foi captado pelas câmeras de segurança, que flagraram o réu de braços cruzados, tomando energético, enquanto a equipe de enfermagem tentava reanimar o paciente.
Por fim, o médico parou de prestar socorro e abandonou a sala de atendimento, deixando as enfermeiras sozinhas. O SAMU acabou sendo acionado, mas já era tarde. O paciente sofreu uma parada cardiorrespiratória e morreu no local.
Julgamento do Conselho Regional de Medicina e afastamento
Na época dos fatos, o réu foi julgado pelo Conselho Regional de Medicina e afastado por 30 dias. A seguir, um trecho do relatório: “O Dr. André não avaliou corretamente o paciente antes e nem após medicá-lo com Dizepam; não tomou as medidas necessárias e corretas para sua recuperação após a primeira reação ao medicamento, ao contrário, insistiu na sua prescrição agravando a evolução, demonstrando assim, além de sua displicência, desconhecimento da farmacologia da medicação prescrita”.
O relatório prossegue: “Tornou-se agressivo com a equipe de enfermagem, direção e funcionários do hospital, responsabilizando-os pelo ocorrido, demonstrando total descontrole da situação, criando um clima de stress aos que presenciavam, inclusive aos outros pacientes que ali se encontravam. Não assumiu seu papel de chefe da equipe e não exerceu seu papel médico na tentativa de salvar a vida do paciente”.
Sentença judicial
André foi julgado e condenado pela Justiça 12 anos e meio após os fatos. A sentença diz que “a indiferença com o resultado morte, que caracteriza o homicídio praticado por dolo eventual, está estampada na conduta do réu, que é médico e praticou o crime no exercício da profissão, mesmo ciente do especial dever de zelo com a vida humana, emanada do juramento no qual se comprometeu a guardar o máximo respeito pela vida humana”.
AÇÃO PENAL Nº 0001507-22.2011.8.24.0016/SC