O governo argentino quer saber o que pensam os cidadãos sobre a imprensa; teme-se que a pesquisa sirva de pretexto para novas restrições aos veículos de comunicação opositores.
Não é de hoje que a liberdade de imprensa vem passando por maus momentos na América Latina, resultado das pressões de governantes populistas para calar aqueles veículos que se atrevem a denunciar e criticar as mazelas de democracias de fachada no continente.
Os exemplos mais gritantes vêm da Venezuela, Argentina, Equador e Bolívia, para citar apenas quatro países onde o jornalismo ético e independente está sendo reprimido à custa de ações do Estado. Emissoras de televisão e rádio são fechadas intempestivamente e medidas que visam controlar jornais são propostas pelos governos com o beneplácito de parlamentos subservientes aos soberanos de plantão.
Contrariamente à truculência empregada por regimes ditatoriais num passado não muito distante, no presente os métodos para silenciar os meios de comunicação são mais sutis, ganhando até ares de legalidade, de modo a justificar os atos perante a opinião pública. É o caso da Venezuela, onde o regime bolivariano de Hugo Chávez conseguiu silenciar praticamente todos os veículos que ousavam criticar o governo, sobrando quase que exclusivamente aqueles que prestam loas ao ditador.
Para tanto, o regime utiliza ações descabidas na Justiça, imposição de multas pesadíssimas, restrições econômicas e, por fim, o fechamento puro e simples do meio com base em artifícios legais, como ocorreu com a RCTV, uma das principais emissoras de televisão venezuelanas, em 2007.
Um episódio que ilustra bem o cerceamento à liberdade de imprensa na Venezuela e, por extensão, atenta contra a própria democracia foi registrado há alguns dias, durante a campanha presidencial em curso no país. Quando fazia um pronunciamento pela televisão, o candidato oposicionista Henrique Caprilles teve a transmissão interrompida para que Chávez entrasse em rede nacional e passasse a discursar.
Inspirados em Chávez, os presidentes da Argentina, Equador e Bolívia seguem pela mesma senda, investindo contra os veículos de comunicação. Uma das justificativas para as ações de censura é a de evitar supostos abusos cometidos por grupos jornalísticos interessados em desarticular os governos populares democraticamente eleitos na América Latina.
Na Argentina, a presidente Cristina Kirchner vem travando uma quebra de braço com o grupo jornalístico Clarín, o mais influente do país. O jornal, que ousa criticar os desmandos presidenciais, já teve até edições inteiras impedidas de circular pela ação de sindicatos atrelados ao governo. Comprando apoio das torcidas organizadas, o governo conseguiu até mesmo tomar do grupo Clarín os direitos de transmissão do campeonato argentino de futebol.
A mais recente medida de Cristina contra a imprensa não alinhada com o seu governo é a distribuição de um questionário à população, com a justificativa de avaliar o que pensam os argentinos sobre os meios de comunicação. A iniciativa vem sendo criticada por se enxergar nela uma manobra para a adoção de novas restrições à imprensa com base no resultado da pesquisa.
No Brasil, a normalidade democrática garante o exercício pleno da liberdade de imprensa. Apesar disso, algumas ações isoladas, como a criação de conselhos de regulamentação da atividade jornalística, encontram eco em alguns setores do governo. À sociedade civil interessa, e muito, se informar sobre tais iniciativas e contestá-las.
Um dos melhores argumentos em favor da imprensa livre é o julgamento do mensalão, atualmente em curso. O Brasil espera que a decisão do Supremo Tribunal Federal a respeito do maior escândalo da história republicana do país seja um marco histórico, que represente o começo do fim de uma era de corrupção; uma revolução que seria impossível sem a participação da imprensa, que trouxe à luz o que tantos gostariam de manter oculto.
Fonte: Abert