ELA: A doença que motivou o “desafio do balde”

Entenda melhor o que é a Esclerose Lateral Amiotrófica, a doença que ganhou a rede social e a popularidade mundial

·
Atualizado há 10 anos

Por Mariana Honesko

Gráfico ELAA doença se tornou popular no Brasil a partir da adoção, especialmente de artistas da TV e outras personalidades famosas, do desafio do balde com gelo. O que era brincadeira ficou sério e na prática, popularizou os efeitos da Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA). A doença não é nova, porém, ainda cheia de incertezas.

Trata-se de uma patologia degenerativa e progressiva, fruto da morte de neurônios e, com ela, da perda de força muscular. É por isso que, oficialmente, a enfermidade recebe o nome de Doença do Neurônio Motor. A ELA, como acabou se tornando mais conhecida, não é tão comum: a literatura médica a compara com a Esclerose Múltipla, cujo registro surge em duas ou três pessoas em cada cem mil, por ano. “O cartão-postal dela é a fraqueza. Não há nenhum outro sintoma a não ser isto”, explica o neurologista Artur José Santos da Costa.

Charge - ElaA esclerose amiotrófica não tem causa definida. Ela simplesmente aparece no organismo, seja de mulher, homem, idosos ou jovens. Estudos pesquisam a transmissão genética. Ela existe, mas é muito rara. “Em 30 anos de profissão, nunca tive nenhum paciente com a doença pela forma genética”, confirma Santos da Costa. A morte dos neurônios e seus efeitos no corpo reduzem a expectativa de vida consideravelmente. “Salvam-se” da projeção mais negativa, contudo, os pacientes de pouca idade. Ainda assim, o mais comum é que a ELA ocorra em pessoas acima dos 40 anos. “É uma doença grave. A média de vida dos pacientes é de três a cinco anos. Quando a doença começa mais tarde, o tempo de vida é menor”, confirma o neurologista.

Valci depende o tempo todo do respirador: dias são mais lentos mas plenamente lúcidos
Valci depende o tempo todo do respirador: dias são mais lentos mas plenamente lúcidos

Diagnosticada a partir de exames mais detalhados, embora simples, a ELA não tem cura. Pelo menos, nenhuma forma de retardo da doença foi encontrada. “Mas não dá para confundir o que não tem cura com o que não tem tratamento. É preciso trabalhar em vários sentidos com o doente para que ele tenha uma qualidade de vida melhor”, lembra Santos da Costa. “A ELA é como o Parkinson ou o Mal de Alzheimer. Ambos não têm cura, mas tem tratamento para melhorar a qualidade de vida”, sinaliza. Entra nesta lista de opções, por exemplo, as sessões de fisioterapia. Elas aparecem fundamentais para a recuperação da sensibilidade motora.

Aos 50 anos, Valci Correia enfrenta a doença

Há um ano, a diarista vivia dias tranquilos, de muito trabalho e de boa saúde. De repente, pernas e braços perderam a força. Pentear o cabelo, por exemplo, exigia grande esforço. Limpar a sua casa e a de seus patrões soou inviável. Há um ano, Valci Terezinha de Assis Correia, de 50 anos, natural e moradora de Porto União, recebeu um banho de água fria. Foi quando apanhou o diagnóstico de que aquela fraqueza toda tinha nome, sobrenome e explicação: Valci estava com ELA. “Isso mudou a nossa vida da água para o vinho”, conta sua irmã, Lucimar de Assis Correia Kreszberg.

Aposentada é otimista e acredita na recuperação
Aposentada é otimista e acredita na recuperação

O quadro clínico de Valci ficou mais comprometido há quatro meses. Foi quando ela teve trombose e, quase ao mesmo tempo, embolia pulmonar. Valci ficou na Unidade de Terapia Avançada (UTI) de um hospital local por quatro meses e nesta semana, voltou para casa. A ex-diarista – agora aposentada, pelas condições de saúde – passa o tempo todo deitada e respira com ajuda de aparelhos. A voz não é mais audível: para entender o que fala, é preciso fazer leitura labial. “Mas eu sei levar isso tudo numa boa. Não sou negativa”, diz, com dificuldade e ainda revelando um pequeno sorriso.

Valci vai enfrentar uma maratona com sessões de fisioterapia. No hospital, elas eram diárias. Conforme Lucimar, o diagnostico “pegou todos de surpresa”, já que Valci jamais teve problema sério de saúde. Ao contrário, esbanjava vitalidade e força. “Eu era muito trabalhadeira”, orgulha-se a paciente de ELA. Confiante, a aposentada acredita na sua recuperação e sonha com o dia em que possa, de novo, caminhar, sozinha e sem qualquer limitação. “No caso da trombose foi só azar mesmo. Vou ficar boa”, brinca.

Dr. Arthur: “mundo gasta muito dinheiro com guerra e arma e o que se gasta com pesquisa está muito aquém do desejado”
Dr. Arthur: “mundo gasta muito dinheiro com guerra e arma e o que se gasta com pesquisa está muito aquém do desejado”

Entenda o banho de água gelada

O desafio nada mais é que uma campanha solidária para ajudar a ALS Association, uma organização americana sem fins lucrativos que arrecada fundos para pesquisas e ajuda aos pacientes da ELA.

A proposta é simples: a pessoa toma banho de água gelada, publica a imagem nas redes sociais, e depois desafia os amigos. Quem for desafiado tem 24 horas para aceitar e, então, encher um balde de gelo com água e fazer o mesmo. Se não fizer, deve doar US$ 100 para a associação.

O banho, na verdade, é um gesto simbólico, e compara a sensação de arrepio e susto com que o sente o paciente quando recebe o diagnóstico. A campanha começou nos Estados Unidos e logo se espalhou pelo mundo, por meio da rede social. “Acho toda essa mobilização muito interessante. As campanhas sensibilizam para mais pesquisa. Hoje, o mundo gasta muito dinheiro com guerra e arma e o que se gasta com pesquisa está muito aquém do desejado”, sinaliza o neurologista.

Família precisa de ajuda

Ainda que recebendo apoio dos membros da igreja, dos vizinhos e da prefeitura, Valci precisa de mais auxílio. No momento, a doação de fraldas geriátricas – tamanho XG – seria bem-vinda. Para ajudar, os telefones 8843-4655 e 8803-0567 foram disponibilizados. Valci mora “de favor” em um imóvel cedido por uma ex-patroa. A casa é de fundos, na Rua Matos Costa, no centro de Porto União.

 

Capa  -  ELA Pete FratesA Esclerose Lateral Amiotrófica ganhou a rede social e a popularidade mundial a partir de uma brincadeira com balde e gelo. Famosos pelo mundo todo adotaram a campanha iniciada nos Estados Unidos e quem tem o jogador de beisebol, Henry Louis “Lou” Gehrig, e o físico britânico, Stephen Hawking, seus exemplos e inspirações. “Lou” se despediu da carreira e da vida aos 36 anos. Hawking, aos 72, supera a doença desde os 21 anos. Entenda nesta edição o que há por trás da misteriosa ELA. Pete Frates, portador da doença que aparece já de cadeira de rodas na foto, é o responsável pela mania mundial da campanha do balde de gelo. Graças a ele é que personalidades e pessoas comuns do mundo todo aderiram à campanha.